"A vida é aquilo que você faz daquilo que te fizeram"

domingo, 25 de dezembro de 2011

Obrigada: para alguém tão próxima e tão distante



Tem pessoas que vem e vão de nossas vidas, tem pessoas que vem e nunca mais voltam, tem pessoas que deveriam vir, mas não vem e, finalmente, tem pessoas que vem e nunca voltam. Apesar de tudo isso fazer parte de seu trabalho, para mim isso não diminui seu valor ou importância, ao contrário do que muitas pessoas dizem. Temos dias bons e ruins e só você sabe o quão bons e o quão ruins, e apesar de você me ver nua e crua como ninguém, naquela rápida hora, mais ou menos a cada três dias, você sempre esteve ao meu lado e nunca deixou de acreditar em mim. Não importa o quão mau eu estivesse, lá estava você, trabalhando incansavelmente em busca de dias melhores, de uma Sabrina melhor, perdida nessa floresta de espinhos que é minha vida.

Você já me viu chorando um mar de lágrimas, já viu minha pele aberta e meu sangue escorrendo, já me viu mais inquieta do que nunca, já foi alvo da minha raiva ilógica e da minha dependência, já me viu perder as correntes que me prendiam a realidade, já meu viu recuperá-las, já me viu no fundo do poço e já acompanhou minhas subidas e minhas diversas caídas, já ouviu meu raciocínio impecavelmente lógico e já ouviu minha fala falhar e se tornar confusa e sem sentido, já viu meus melhores sorrisos e minhas dores mais profundas, você esteve presente em todos meus melhores e piores momentos.

Foram pouquíssimas, se não nenhuma, as pessoas em minha vida que conquistaram minha confiança como você. É verdade que ainda existem algumas barreiras entre nós, mas me sinto segura para falar com você sobre a maioria dos assuntos, quase não minto para você, é impossível mentir para você e se você me pede alguma coisa, quase não tem como eu não me esforçar o máximo possível para realizá-la. Algo em você me dá forças para que eu consiga me esforçar mais quando eu acho que não tem mais solução. Já perdi as contas de quantas vezes pisei em seu consultório disposta a falar que desisti e saí com a certeza que ainda havia algo pelo que lutar, como você faz isso? Há poucas coisas que eu goste tanto quanto te deixar orgulhosa. Eu espero que um dia eu consiga te deixar o mais feliz e orgulhosa possível.  Muito obrigada por ser tão forte e constante, por permanecer ao meu lado apesar de tudo, por nunca, de forma alguma, se ofender com minhas atitudes, por continuar acreditando em mim em situações onde ninguém mais acreditaria, por não deixar com que nenhuma, por menor que seja, vitória minha passe sem a devida comemoração e reconhecimento. Ninguém sabe o quão difícil é para mim dar o mais simples dos passos e o quanto ouvir um parabéns e ver seu sorriso me dão forças. Obrigada doutora, eu nunca chegaria onde estou agora sem você e todo o seu apoio e suporte. Você não sabe, mas nas primeiras vezes que pisei em seu consultório eu tive a certeza que seria sua pior paciente... Espero um dia sair dele, sabendo que fui uma das suas melhores.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Eu não sou um bichinho de estimação



Quer dizer que você sabe lidar comigo? Quer dizer que você sabe o que faz bem para mim? Quer dizer que você tem a fórmula para me controlar? E entende cada um dos meus comportamentos e detalhes? Sinto-lhe dizer que você não é minha mãe e que nem minha mãe consegue me entender ou adivinhar qual a direção dos furacões dentro da minha mente. Não aja com a certeza de que tudo está sob seu controle, não aja como se eu fosse seu bichinho de estimação e obedecesse todo comando pronunciado por seus lábios com toda a alegria do mundo. Não, você está enganada. Eu sou um ser humano, por incrível que pareça, e tenho necessidades maiores do que seu cachorro. Se ao menos você conseguisse me ver como uma pessoa normal você entenderia. É simples... É questão de respeito, de consideração, de crescer. É preciso mudar para que daqui alguns anos eu não olhe para trás arrependida dos anos que terei passado ao seu lado, imagino que o arrependimento seja um dos piores sentimentos que possamos sentir. Eu preciso viver, do que para mim é, o melhor jeito possível. E o melhor jeito possível, que eu enxergo hoje, é ao seu lado, realmente ao seu lado, não como amiga, não como algo que você possa usar só de vez enquanto, mas como companheira. É isso que eu quero. Não trabalhamos com meio termos. O morno machuca mais do que o congelante, é ali, no morno, que mora a indiferença, a não existência, a falta de vontade, a não ação, tudo o que eu mais odeio.

Você responde mais à minha raiva do que ao meu amor. Você me valoriza mais quando estou próxima a te deixar do que quando te abraço forte dizendo que te amo. É engraçado como as pessoas são contraditórias e confusas. Tem-se medo de perder o que possuí, mas assim que se sentem seguros, o que possui vai perdendo o valor gradativamente. O quintal do vizinho é muito mais verde, certo? Um 'eu te amo' perde a magia com o tempo, um abraço, um dar de mãos. Esses dias dei a mão para um amigo e me senti tão segura, eu costumava me sentir assim quando segurava sua mão, agora só andamos de braços dados, para que dar as mãos? Simplesmente porque dar as mãos faz eu me sentir melhor... Só por isso. Há quanto tempo você não segura minha mão? Quando sentávamos lado a lado e você conversava com alguém, em nenhum momento você tirava a mão da minha perna, mostrando que estava ali comigo o tempo inteiro, apesar de não estar conversando comigo, lembra? Lembra do quanto você estava disposta a enfrentar por mim? Lembra que você enfrentou sua mãe, seu pai e sua irmã falando que estávamos juntas? E a consequência nem foi tão ruim assim quanto você imaginou. Agora você só se esconde. Agora você não enfrenta nada por mim, nenhum esforço, nada. Se der para nos vermos foi por sorte, só por isso. Algumas mentiras convenientes, mas nada que seja realmente por mim. Você mente exatamente igual para passar a noite bebendo. Eu não sou um copo de cerveja. Onde está você nesse relacionamento? Onde esta seu esforço? Não basta dizer 'eu te amo', é preciso provar. Palavras são só palavras. Não querem dizer nada. Amor para mim é mover o mundo para ser feliz junto àquela pessoa. Amar é ter coragem.

Sinto, mas estou cansada de ouvir só palavras vindas de você. Quando eu vou ser alguém na sua vida? Quando você vai ser orgulhar de me ter ao seu lado não importa o que houver? Quando você vai enfrentar tudo o que for possível para me ter ao seu lado? Quando estarei entre suas prioridades? Quando? Se não for agora, então há muito estamos perdendo tempo.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Blá-blá-blá



As coisas perdem o sentido... Um dia você simplesmente se vê correndo de um lado para o outro sem saber do que está atrás. E todos aqueles sonhos? E todas aquelas palavras que acreditei fielmente? Quer dizer que eu entendi tudo errado? Quer dizer que acabei por fantasiar de novo? Quer dizer que as coisas nunca foram desse jeito? Me sinto uma idiota. Mais idiota do que o normal. Onde estou? Quem é você? Meu peito dói como nunca e você está tão distante que parece deixar de existir a cada dia que passa. Parece que a única coisa que eu recebo em resposta é esse seu silêncio absurdo, gritando em meus ouvidos até me deixar surda. Quem sente falta faz de tudo para aliviá-la. Então onde está você agora? Estou tão cansada de desculpas, de ser jogada para trás, de ficar em segundo plano, ser ignorada, desvalorizada e trocada por qualquer coisa. Você nem percebe. Todos a sua volta percebem, menos você. E aqui estou eu, esperando e esperando, como uma retardada, como sempre, sempre disposta, sempre capaz de fazer qualquer sacrifício só para olhar em seus olhos de novo, nem que seja por pouco tempo, tudo bem. Mas de repente, eu perdi o interesse, né? De repente isso não é mais o suficiente. Tudo bem, minhas aulas de filosofia me avisaram sobre isso, todos falam sobre isso o tempo inteiro. Eu só pensei que com nós seria diferente, como todo o idiota apaixonado e iludido.

Estou cansada de pessoas entrando e saindo da minha vida, cansada de despedidas, de brigas e tantas frescuras. As pessoas passam a vida inteira tentando se dar bem e no fim acabam todas fodidas e mais solitárias que bicho de intestino. Vá atrás do seu dinheiro, vá. Vá atrás de todas as mulheres das baladas, de sexo fácil, tanto faz, mas ASSUMA sua atitude de vez. Assuma suas escolhas e permaneça do seu lado do planeta, obrigada. Não entre em nenhuma sombra de relacionamento se você não sabe o que é um relacionamento, se você não quer saber, se você está pouco se fodendo, se você não acredita no amor ou sei lá o que. Porque tem pessoas retardadas como eu, que podem se enganar e não é legal. E se você é confuso de mais, não sabe o que quer da vida, cresça, decida-se. Aprenda a fazer escolhas, aprenda que a porra de uma escolha implica em sacrifícios, muitos sacrifícios e consequências, assuma essas merdas de consequências como um adulto, de cabeça erguida e com toda a certeza e força do mundo. Porque senão, qualquer pequeno questionamento de qualquer idiota vai te destruir e balançar suas bases, então você vai se ver tremendo de insegurança e medo. EU tenho certeza do que eu quero, tenho certeza desde aquele primeiro dia. Você tem? Claro que não.

Eu abandonei uma vida inteira em nome disso, eu enfrentei minha mãe, meu pai, minha família inteira, Deus, minha avó, todos. Eu mesma. Eu nunca olhei para atrás, em nenhum momento me arrependo. Todos os dias eu me mantenho firme. Foi difícil impor respeito, foi difícil fazer com que as pessoas entendessem que eu sou assim, que isso me faz feliz, foi muito difícil. Eu que sempre obedeci todo mundo de cabeça baixa, eu que nunca tive coragem de nada, eu que sempre fui quieta, eu que sempre fui um carrasco de mim mesma. Eu fiz uma escolha. Escolhi por ser feliz do meu jeito, escolhi por ser quem eu quiser ser e não dar ouvidos a quem durante tanto tempo me manteve trancafiada em algum lugar obscuro. Cade suas atitudes? Cade seu orgulho, sua coragem? Eu cheguei ao fundo do poço para entender que precisava ser forte, se você for um pouco mais esperta pode aprender com meus erros. Que tal? Você está cansada de saber que se você fizer o que precisa ser feito eu estarei do seu lado o tempo inteiro. Mas as vezes parece que você simplesmente vive por inércia. Vai deixando que as coisas aconteçam, dificilmente se mexe para alguma coisa, dificilmente escolhe alguma coisa, dificilmente faz alguma coisa por escolha própria. Nada. Você só existe, não vive. Porque na minha humilde opinião, viver não se resume ao quão bêbada você pode ficar em uma balada deprimente qualquer.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Perfeitamente imperfeita.



Ela tem tanto medo de se sentir culpada que peca por excesso e por falta. Só se mexe quando corre o risco de receber a tal culpa e quando se mexe é movida pelo exagero e pela ânsia de tentar suprir a ausência causada pela indiferença; quando a noção de culpa parecia distante e irreal. Ela foge e deseja a fuga, mas sempre volta para o mesmo lugar. Tantos problemas e nada para aliviá-los. A máscara que ela veste é a da indiferença ou a da preocupação? As duas? Nenhuma? Perdida, confusa. O que ela quer? Para onde vai? O quanto está disposta a renunciar, sendo que escolher é renunciar, para conseguir o que quer? Tudo? Nada? Nem ela sabe.

Transita entre pessoas, festas, amizades, bebidas. Tantas em quantidade, quantas em qualidade? Presa se fazendo de livre, o que importa é parecer bem. Sonha ser útil, tendo a utilidade uma definição esquisita aos seus olhos, nada sabe, pouco faz, muito lamenta, muito se culpa, muitos medos e inseguranças. Que desaparecem assim que algo novo surge ou alguém novo entra em cena. O que importa vem dos olhos para fora, vem de uma nova amizade para uma nova amizade. Comunicativa, simpática, de aparente fácil convivência. Indiferença. Tanto faz. Claro que gosto de você. Desaparece mais rápido que qualquer coisa, líquida, inconstante, nada de compromissos, inconfiável. A culpa é sua, a culpa é minha. Vamos viver o hoje. Pensando no futuro de forma tão dolorosa quanto no passado.

Cortes e sangue entre nós, tragédias, traumas, coisas aprendidas, esforço nenhum para superá-las. Todo o esforço do mundo. Mude. Melhore. Desculpas e erros repetidos. Lágrimas. Conversas e não-conversas. O que posso fazer? Para mim ela é perfeita.


segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Um adolescente qualquer em um lugar qualquer.



Em uma nação vigiada pelos olhos de Deus, um adolescente olhava-se no espelho do banheiro da sua casa. Seu olho roxo e inchado tornava seu rosto grotesco, sua mente povoada de xingamentos e provocações, nenhuma lágrima. Da onde estava podia ouvir seus pais discutindo na sala. Sua mãe estava preocupada com as constantes brigas que seu filho se metia na escola, seu pai dizia que elas eram boas porque fariam do garoto, um homem. Gritos e mais gritos, mais um vazo quebrado, nenhuma conclusão, nenhuma ação.

Lucas saiu do banheiro e se trancou em seu quarto. Ligou o computador e com os fones de ouvido ficou escutando todas as músicas escritas para ele. Tentou imaginar se existiam outros garotos como ele e o que eles estariam fazendo no momento. Não conseguiu imaginar nada, a não ser ele mesmo, sentado naquela cadeira patética, com o olho roxo e as mãos tremulas. Constantemente entrava em pânico por nada e quando tinha motivos reais para entrar em pânico ele simplesmente não sentia nada. Ele sabia, desde quando conseguia se lembrar, que havia algo de errado com ele, só não sabia dizer o que. As pessoas a sua volta confirmavam isso batendo nele, xingando-o e o excluindo de todas as maneiras. Desde quando conseguia se lembrar.

O que faz uma pessoa tão diferente que ela tenha que sofrer tudo isso por conta dessa diferença? Lucas não sabia dizer. Talvez ele fosse burro de mais para perceber, parecia que todo mundo sabia menos ele. Lucas achava injusto ninguém lhe contar o grande segredo que o tornava tão errado e tão diferente em relação aos outros. Quando pequeno havia perguntado isso para sua mãe, recebera um tapa e um "pare de atrapalhar os adultos com bobagens."

O garoto não chorava. Homens não choram. Dessa forma, recebia tudo o que lhe davam de ruim em silêncio, com a indiferença já citada. As vezes, enquanto apanhava, pensava em Deus e perguntava-lhe onde estava errando, o que o fazia merecedor disso. Nunca obtinha resposta alguma. Deus deveria estar muito ocupado com outras coisas, ou então também não gostava dele.

Lucas era um garoto muito solitário, porém não se sentia sozinho, pois nunca havia conhecido companhia alguma. Há algumas semanas havia roubado a arma que seu pai mantinha guardada no armário da garagem. Não sabia muito bem porque havia feito isso, mas gostava de sentir o peso dela em suas mãos. Havia desenvolvido uma espécie de jogo esquisito; toda a vez que apanhava, ele colocava uma única bala no tambor e o girava, então apontava a arma para a própria cabeça e apertava o gatilho. Tivera sorte até então, a bala nunca estava lá. Já havia brincado desse jogo hoje, mas decidiu se dar uma segunda chance. Ele se sentia vivo fazendo isso. Toda a vez que apertava o gatilho e nada acontecia, ele dizia para si mesmo que não chegara sua hora, que ainda restava esperança, que alguém, em algum lugar, olhava por ele. Estou vivo. Repetia para si mesmo. Algo me espera amanhã para que eu não tenha morrido hoje. E assim, ele conseguia sorrir por alguns segundos.

Pensando nisso ele apontou a arma para a própria cabeça e apertou o gatilho. Nada de novo. As lágrimas escorreram pelo seu rosto como não acontecia há muitos anos. Amanhã é outro dia. Não quero outro dia. Nada de novo me espera amanhã, não há esperança, só socos e palavras pesadas como pedras, não há nada, não há ninguém. Pressionou o gatilho e dessa vez ganhou o jogo.

domingo, 18 de dezembro de 2011

O dia em que as despedidas não serão mais necessárias



Um aperto no peito, solidão  e perda de sentido. Há tantas coisas entre nós, tantos problemas, pessoas, proibições, regras, brigas. Pedras e mais pedras que me irritam terrivelmente. Eu não sei o que fazer, nem você, mas você tem infinitas válvulas de escapes, eu não. Minha dor é certa e sempre crescente, não sei lidar com ela, não quero lidar com ela. Sou especialista em fugas. Olho para os lados. E agora? Agora nada, não sei, não quero, não qualquer coisa. Preciso de direções, uma bússola, uma mão que me guie, alguém que me diga o que fazer, um amigo. Um amigo? O que significa amizade? A cada ano que passa mais eu desconfio dessa palavra, acho que nomeio as pessoas erradas com esses nomes e as certas se perdem em minha mente, em minha vida, há quilômetros de distância. Tenho dificuldade de lembrar da existência das pessoas quando elas parecem distantes aos meus olhos, assim, não peço ajuda, não converso, não faço nada. Todos parecem ter morrido e eu fiquei, ou eu morri e eles ficaram, algo assim.

Estou cansada de nada fazer, de tanto pensar e ter a vida a passar em algum lugar distante. Me sinto uma visitante de tudo isso, alguém que só existe de vez em quando, e quando existe, sente tudo a volta com estranheza de quem não pertence a esse lugar. Deixei parte de mim perdida em outro universo qualquer, ou outro universo qualquer roubou parte de mim, acho que é por isso que odeio despedidas. Sinto que a cada adeus, um pedaço de mim também me deixasse. Dessa forma vou sumindo todos os dias. Isso é no mínimo desconfortável. Tenho medo. Sou extremamente insegura quanto a tudo. Como você pode me garantir que nos veremos de novo? Preciso de provas, preciso de algo palpável, preciso sentir em minhas mãos que você vai voltar. Preciso que você deixe algo comigo, ao invés de ser eu sempre que deixe algo com você. O que é impossível.

As vezes vai, as vezes volta. Tudo imprevisível de mais. Todos os lugares me lembram ele, um amigo me disse. É... Todos os lugares me lembram ela. Dói lembrar. Porque o tempo não volta, as pessoas dificilmente voltam, e as dificuldades de hoje, serão as de amanhã e assim por diante por tempo indeterminado. Minha mulher tem mania de esperar de mais do ano que está por vir, ela pinta o futuro de uma forma que aos meus olhos parece brilhante. Tudo vai ficar mais fácil, você vai ver. Não sei dizer se as coisas ficaram mais fáceis, ou foram nós que aprendemos a contorná-las de forma mais eficiente. Estou mais para a segunda opção. Ainda espero o dia em que poderemos ser quem somos sem mascara nenhuma, sem medo e sem vergonha. Simplesmente duas meninas de mãos dadas. Nada que interesse aos outros passantes, nada de errado, nada de estranho. Só duas meninas. Sem família nenhuma a proibir coisa alguma, sem igrejas, sem deuses, sem regras sem sentido, sem brigas inúteis, sem gritos, sem lágrimas, sem grandes dramas, sem essa frescura toda irritante.

Para meu irmão, com o carinho que eu nunca consegui demonstrar



Ei, você... Tão perto e tão longe, uma porta de distância, dois universos se afastando infinitamente ao longo dos anos. Ei, você. Tão indiferente. Eu também pareço indiferente a seus olhos? Eu pareço fria e distante? Eu não sou, só queria poder te dizer, poder te olhar nos olhos e te abraçar, só isso. Eu te amo, queria que você soubesse, não só por dizer, assim da boca para fora, não. Eu te amo de toda minha alma, eu sempre te amei. O que houve entre nós? Você se lembra? Quando você me batia nós eramos mais próximos do que agora, bem mais próximos. Sabe, eu nunca pensei mas agora percebo que todas as vezes que você me viu quietinha em meu canto, brincando sozinha, alheia ao mundo e fechada e você veio até mim, arrancou o que me distraía das mãos, me bateu e me provocou... Todas essas vezes você estava tentando me salvar de uma forma ou outra. Eu não percebia que era você que todos os dias impedia que eu me fechasse para sempre, eu nunca percebi e hoje simplesmente escutei sua voz e entendi. Sua violência infantil era a única coisa que me tirava do meu pequeno e apertado universo. Você me obrigava a interagir, lembra? Eu não queria saber de nada, nem de ninguém, sempre sozinha, sempre quieta, sempre indiferente. Você não desistia de mim não é mesmo?

Lá estava você quebrando tudo que me mantinha fechada, me arrancando a força do meu universo, todos os dias. As vezes tínhamos um bom dia e eu brincava com você, na maioria das vezes eu só chorava e fugia. Sabe... Nunca ninguém tentou tanto quebrar o muro a minha volta quanto você. Por anos e anos você tentou. Eu sempre distante, sempre quieta, sempre indiferente. Você irritadiço e frustrado. Brinque comigo Sabrina. Não. Os anos se passaram e você desistiu. Agora meu silêncio é acompanhado pelo seu, minha indiferença pela sua, meu distanciamento pelo seu. Você me perdeu e eu nunca te tive. Me desculpe por ter sido uma péssima irmã... Você apanhava por tentar me salvar, e de uma forma que eu não conseguia entender na época, não havia lágrima mais doída que escorria pelos meus olhos do que aquelas por te ver chorando. Eu queria ter sido sua irmã mais velha, eu queria ter conseguido ser sua amiga, mas eu estava ocupada de mais me fechando em mim mesma. Me desculpe, me desculpe. O que eu fiz com você? Onde você está agora? Sinto sua falta, você nem imagina o quanto eu sinto sua falta. As vezes eu paro na porta do seu quarto, só pensando em como eu poderia entrar e conversar com você, mas eu não consigo. Você olha para mim assustado e pergunta o que foi, eu balanço a cabeça negativamente e volto para meu mundo. Sinto sua falta.

Obrigada por ter sido a melhor pessoa que eu já conheci, obrigada por ter me amado mais do que ninguém todos esses anos, obrigada por ter me salvado tantas vezes, obrigada por ter sido meu melhor amigo disfarçado de inimigo, obrigada... Me desculpe por todas as vezes que te ignorei, fui fria, distante e intocável, me desculpe por esse muro entre nós, me desculpe pelas lágrimas que você já me viu derramar, e pela culpa que você sentia por me machucar, eu sei que não era sua intenção, eu que sempre fui frágil de mais, me desculpe, me desculpe por ter tentado até desistir de mim, me desculpe por você ter que me ver todos os dias e aguentar minha loucura como uma estátua. Me desculpe por ser uma péssima irmã mais velha... Eu nunca te defendi como deveria, eu nunca cuidei de você, eu nunca fiz nada. E você fez todo o possível por mim. Por favor me desculpe. Por favor, me ajude a destruir esse muro, essa distância vem me matando a vida inteira e eu nunca tinha reparado como agora. Como eu consigo sobreviver com isso entre nós? Por que eu nunca fiz nada? Qual o problema comigo?

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Sempre atrás daquele algo a mais que não existe



Seguir em frente é sempre complicado demais, se eu fechar os olhos muito provavelmente meus pés andariam para trás. Os dias correm como se tudo não passasse de uma realidade inventada pela minha cabeça maluca, estou aqui e não estou, esperando por uma época em que esse buraco negro aqui dentro deixe de existir, esperando por um sorriso que não se apague tão facilmente, esperando e esperando. As pessoas ficam felizes quando eu não me corto, quando minha mente recupera sua lógica e minhas conquistas se tornam cada vez maiores, eu, porém, não consigo me alegrar, muito menos me orgulhar de mim mesma. Há esse algo sempre faltando. Nenhuma alegria dura o suficiente, nada dura o suficiente, a não ser as coisas ruins, claro.

Me sinto cercada de finais e o esforço necessário para começar algo novo me desanima por completo. Ao mesmo tempo, não consigo para de jeito nenhum, são tantas coisas e tão pouca vontade. Tudo o que eu faço precisa ser o mais perfeito possível. Eu faço, eu faço tudo, tentando desesperadamente provar para mim mesma que eu valho a pena, que eu não estou perdida.

Eu estou sempre perdida, nada que eu faça consegue me convencer. Não passo de uma pilha de frustrações e decepções. Tudo o que eu faço, faço repetindo para mim mesma que não vou conseguir, que eu sou horrível e burra, e quando eu consigo, a indiferença logo toma conta de mim. E daí? Grande coisa... Qualquer um conseguiria. Você é uma inútil. Eu sou uma inútil, invisível, ninguém, tanto faz.

E tem as pessoas, por todo o lado, com seus sorrisos, bons dias e vontade de criar intrigas. Quase todas, uma hora ou outra, me cansam. Sinto que cada vez mais gosto da solidão, apesar da mesma me destruir. De qualquer jeito, o que sou eu se não uma autodestrução ambulante? Está tudo sempre tão errado que eu já imagino como sendo certo. E aqui estou eu falando besteiras o tempo inteiro, reclamando sem parar e me mexendo na velocidade de uma lesma. Talvez eu não me canse das pessoas, mas sim do peso que faço da minha relação com elas, minha dependência problemática, minha necessidade absurda de aceitação. Quem sabe.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Colocando em palavras o intraduzível: Os dois mundos


Uma montanha russa não faz sentido por si só, não nos leva a lugar algum e não passa de um trajeto circular cheio de altos e baixos, viradas bruscas e surpresas assustadoras. Nunca podemos prever o quão grande será a próxima queda e o que nos espera na próxima curva.

Se permanecemos durante muito tempo a bordo de uma montanha russa, ela deixa de ser divertida ou assustadora e passa a ser angustiante. Aos poucos você decora seu trajeto, mas isso não te deixa aliviado de forma alguma, ao contrário. Você tem plena consciência para onde está indo e onde irá parar, porém a ausência de controle sobre sua própria vida te destrói por completo. Chega um dia que aquele carrossel se torna tão insuportável que você começa a se perguntar quando decidiu ali embarcar, o maldito dia que colocou os pés naquele vagão para nunca mais sair. Não existe respostas, não existe saída, objetivos ou coerência. Tudo não passa de altos e baixos, curvas bruscas e violentas sem sentido.

Agora imagine que exista dois mundos, o interno e o externo. Imagine que seu mundo interno seja essa vida a bordo de uma montanha russa sem fim e que seu mundo externo seja como o de todo mundo. Porém há um problema, esses dois mundos estão totalmente desconectados, o que acontece no mundo interno não se reflete no externo e vice versa, sentimentos estão não só fora de sintonia com a realidade, quanto estão de tamanhos desproporcionais e intensidades ilógicas. No mundo externo faz Sol e tudo vai bem, no interno você está em plena queda livre e assim por diante. Não há saída, não há forma alguma sincronizar os dois mundos, sua existência se resume na loucura que é viver duas vidas opostas e incoerentes e tentar trazer um pouco de racionalidade a tudo isso, não existe respostas fáceis, o choque dos dois mundos te prejudica, te atrasa, te machuca, te torna dependente, frágil, assustado e incapaz. Além de tudo você precisa disfarçar a existência quebradiça desses dois mundos, é preciso se controlar a cada instante, vigiar seus atos, falas e pensamentos, é preciso buscar equilíbrio em um solo que nunca viu algo parecido, é preciso lutar contra sua própria essência, é preciso vestir máscaras, armaduras, defesas, é preciso buscar saídas aceitas pelo mundo externo em meio a um caos descontrolado que é o mundo interno. E você nem sempre consegue... E cada pequena falha gera consequências terríveis.

É mais ou menos assim que eu me sinto.

domingo, 11 de dezembro de 2011

Onde o sol sempre brilha, a luz nos cega - Clara e seus sorrisos


Era uma vez uma terra governada pelo Sol, que brilhava insistentemente em quase todos os momentos. As vezes, em dias de medo e escuridão, uma chuva torrencial assolava a terra inteira e, nesses dias, todas as pessoas que ali moravam eram muito bem instruídas para permanecerem em lugares protegidos. Entre as regras principais daquele planeta, uma delas era a proibição para qualquer pessoas de se molhar e dessa forma se contaminar com a água da chuva. Em uma terra onde o que reinava era a luz, toda e qualquer escuridão era vista com maus olhos.

De dentro de uma casa grande uma menininha observava a chuva se derramando rua abaixo, os pingos dançavam ao entrarem em contato com o chão e Clara tentava olhar todos ao mesmo tempo. Como todos os habitantes daquele lugar, a menininha também sentia repulsa pela chuva, porém havia outras coisas naquele mundo que a assustavam. Subindo as escadas de sua casa, escondido em um canto no andar superior, havia um armário gigante onde todos os segredos, problemas e erros eram colocados uns sobre os outros, trancados de forma desorganizada, a pequena Clara tinha certeza que a qualquer momento a tranca não suportaria e tudo voaria para fora daqui, infestando a casa inteira. As vezes, ao passar por esse armário em caminho de seu quarto, uma sombra de medo se escorregava para fora do armário e a seguia quarto adentro, permanecendo ali por tempo indeterminado. Talvez, você que mora na Terra, esperaria que uma criança avisasse os pais quando estivesse com medo de algo, lá as coisas não eram assim. Havia regras naquele planeta iluminado. Uma delas, além de permanecer longe da chuva, era de nunca falar sobre coisas ruins.

Outra regra muito importante era sempre sorrir. Sempre. Uma pessoa que parece feliz, se torna feliz, era o lema daquele povo. Clara se lembrou de sorrir e assim permaneceu por um tempo, sorrindo para a chuva enquanto suas mãos tremiam de medo e nervosismo. Clara tinha um amigo imaginário. O que também era proibido ali, exercitar a imaginação incentiva questionamentos que leva a desordem, ter um amigo imaginário não era uma boa idéia, porém a garotinha não tinha como evitar, seu amigo simplesmente existia e por mais que ela tentasse ignorar, não havia como. Era exatamente como a sombra do armário, ela estava lá, Clara não sabia como ou porque, mas ela estava.

De um jeito ou de outro, Max, o amiguinho imaginário de Clara, sorriu para ela enquanto a garota se esforçava para continuar sorrindo em direção a chuva. Clara gostava de Max porque seus sorrisos nunca eram falsos, Max sorria quando bem entendia e para quem ele quisesse. Ele era livre. A garotinha desistiu de sorrir e deixou seus braços penderem tristemente ao seu lado enquanto encarava o chão cansada. Porque diabos a chuva tinha que ser algo tão ruim e triste. Clara não gostava tanto assim do Sol, o Sol queimava, a luz cegava, não conseguia entender porque as pessoas estavam tão dispostas a obedecer-lhe. Ei Clara, porque você não sai para a chuva? Max disse. Aposto que a sensação de ter ela dançando pela pele deve ser ótima, não está vendo ela escorrendo pelo chão como é legal? Clara concordou com a cabeça. Não conseguia entender porque as coisas eram proibidas, coisas bonitas como a chuva. A garotinha respirou fundo, olhou para o andar superior estremecendo, abriu a porta de casa e saiu chuva afora gritando de alegria, com Max a seu lado.

Foi o dia mais feliz de sua vida, se sentiu livre como nunca, sem sol nenhum para vigiar sua nuca ou regras e segredos para prender-lhe o rosto em um sorriso frio e sem sentido. Acordou por alguns minutos em uma cama de hospital, a chuva é ácida, corrói a carne humana rapidamente. Existia um motivo para a proibição. Mas Clara escolheu a liberdade, morreu em uma manhã mais ensolarada do que nunca, pela primeira vez sentindo um sorriso verdadeiro em seus lábios maus acostumados.

sábado, 10 de dezembro de 2011

Palavras vazias, meu muro, falsas expectativas



As malditas palavras travam na garganta e eu sinto como se voltasse a ter dois anos e estivesse aprendendo a falar de novo. Como posso responder essas perguntas, como posso me explicar. Não consigo, não sei. Tudo o que eu queria era poder conversar decentemente quando estivesse com problemas, mas eu não consigo, sempre que aqui dói eu guardo, eu seguro ou então expresso de formas estranhas que não envolvem falar. Não sei lidar com o incomodo, medo, dor ou qualquer outra coisa ruim. Não adianta... E sempre que consigo falar eu me arrependo, o que faz com que eu fale cada vez menos. Nunca estou preparada para enfrentar qualquer situação e acho que nunca vou estar, estou sempre o mais desarmada possível, o mais vulnerável possível. É um perigo ser idiota, sonhar acordada, esperar que as coisas vão dar certo porque não há como piorar (sempre há como piorar).

Estou com medo e insegura. Será que você sente o que eu sinto por você? Como serão as coisas no futuro? Será que um dia eu serei mais importante para você do que uma balada com seus amigos? Será que eu sempre me sentirei como um objeto, uma segunda opção, um cachorrinho? Há tantas coisas que eu gostaria de saber, há tantas coisas que eu gostaria de te dizer e te perguntar, mas tenho medo das respostas... Eu te conheço bem de mais para saber que não devo esperar nada de você. Mas simplesmente não consigo.

Tudo isso me lembra o começo, a insegurança terrível, a quase certeza que nada iria durar e que eu precisava aproveitar cada segundo com todo o meu ser, aquele medo, as lágrimas, o desespero e as infinitas preces para que você mudasse ou para que eu mudasse e você me visse de uma forma diferente, me tratasse diferente, qualquer coisa que fizesse com que você entendesse o que eu estava sentido e pudesse sentir isso também. Quais eram as chances para dar certo? Nenhuma, eu entendia isso bastante bem... Porém, aos trancos e barrancos, as coisas foram indo e continuam indo. Você mudou, eu mudei. Crescemos, certo? Muito mais do que eu esperava, mais rápido do que eu esperava também. Mas no momento me sinto de volta ao colégio, o que é assustador.

Bom... que se foda. Estou cansada de pensar, os calmantes me ajudam a manter minha cabeça no lugar, odeio todos os outros remédios, mas gosto dos calmantes agora. Vira e mexe eu tenho vontade de desistir do tratamento, tipo agora, posso parar de tomar meus remédios, juntar todos eles durante uma semana e tomar tudo de uma vez, o que será que acontece? É tão fácil... Sempre penso que posso fazer isso quando meu psiquiatra aumenta meus remédios, cara, é tão fácil. Será que ele é burro mesmo de deixar tudo isso na minha mão ou será que ele confia em mim? Não faço ideia. Estou irritada desde ontem porque estourei meu elástico em meu pulso e perdi ele, procurei em todo o lugar para tentar amarrar as duas pontas e continuar a usar mas não achei. Bom, de qualquer jeito a dor do elástico só faz cocegas em mim agora, eu só uso quando eu não tenho MESMO outra forma de me acalmar e caso tenha alguém por perto e eu queira ser discreta, se não eu meto a cabeça na parede mesmo, ou me corto, obviamente.

Ah... mas essa falha de comunicação. Se eu pudesse ou conseguisse gritar por ajuda a cada vez que meu mundo começasse a despedaçar diante de meus olhos, se eu pudesse fazer um sinal que seja a cada vez que meu peito doesse de forma insuportável, se meus olhos denunciassem claramente meus medos, se de alguma forma eu pudesse falasse qualquer coisa. Mas eu não falo, não sei como se pede ajuda, todas as conversas são monólogos que eu escuto de um lugar distante em meio a minha tempestade emocional, as frases soltas queimam minha pele mas não consigo responder a elas, deixo com que elas se aproximem a vontade e façam o que bem entende. As pessoas me acusam de construir um muro ao meu redor e por isso não conseguir criar relações fortes o bastante... Eu nunca estive ciente da construção desse muro, se ele realmente existe, pelo amor de deus, delicadamente, vamos derrubá-lo juntos, você do lado de lá, eu do lado de cá. Cuidado com as pedras, se você tentar derrubá-lo muito rapidamente, elas podem me sufocar do lado de cá, é preciso tirar uma por uma com cuidado. Sinto que estou sempre morrendo do lado de cá, sufocada, assassinada, de cansaço, de todas as formas, preciso me mexer devagar, com alma, sempre atenta e com todas as minhas forças, qualquer movimento em falso, bruto, distraído ou errado pode ser o fim. Sinto como se andasse sobre um lago parcialmente congelado, sobre aquela fina camada de gelo, absolutamente pronta para se partir a qualquer momento. E eu sinto tanto medo quanto indiferença.

Sempre um fim de mundo


Um pequeno acontecimento faz minha vida inteira perder o sentido. Me sinto um cego em pleno tiroteio. E agora? Não faça disso o fim do mundo, as pessoas me dizem e em seguida listam soluções. Não, vocês não entendem, tenho preguiça de me explicar. As palavras são inúteis de mais, não sei usá-las de forma correta. Se é que alguém sabe. Estou sempre perdida de mais e nunca sou boa o bastante para minhas próprias exigências. As vezes não sei se o mundo corre de mais para que eu consiga acompanhá-lo ou se sou eu que corro de mais para que o mundo consiga me acompanhar. Talvez os dois, talvez nenhum deles. Tanto faz. Me sinto vazia de mais para chorar, me importar ou o que quer que seja, mas há cinco segundos atrás eu estava tão cheia de sentimentos que pensei que nunca mais pararia de chorar, isso confunde minha cabeça.

E lá está ela, bêbada e se divertindo de mais para perceber que as férias estão chegando e que provavelmente esta tenha sido a última vez em meses que a gente conseguiu passar uma noite juntas. Algumas frases ditas ontem continuam ecoando terrivelmente em minha cabeça dolorida (bati ela ontem na parede com toda a minha força), talvez eu as tenha entendido errado, não sei... Mas o fato é que elas estão aqui diante de mim e eu não sei o que diabos eu fiz de errado para merecê-las, estou cansada, como sempre. Não, não estou cansada, estou indiferente, o que é pior. Faça o que você quiser, certo? Faça o que você quiser comigo, com você, com nós... Tanto faz. Como sempre, vou agradecer os dias de sorte, quando você notar que eu existo e quiser ficar comigo e vou lamentar os dias de azar, quando eu for ninguém aos seus olhos, quando seus beijos se resumirem a alguns segundos frios e distantes e eu perceber que implorar por atenção não adianta de nada. Tanto faz.

Todo o esforço que eu faço todos os dias é completamente inútil. Estou confusa, tem algo de errado, não tem? Tem algo bastante errado. As pessoas estão o tempo inteiro exigindo de mim melhores atitudes e tantas outras coisas, e eu nunca exigi nada de ninguém... Porque não pode ser eu quem dita as regras? Porque? Porque só eu preciso melhorar e parar de fazer coisas? Isso não faz sentido. Ah sim... Eu tenho um rótulo na minha testa, que permite com que eu leve bronca a vontade e não tenha "moral" para pedir nada à ninguém. Tudo certo e muito justo, claro.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Desabafos de uma garota errada no caminho certo - Só mais uma idiota revoltadinha


(Me perdoem a agressividade e uso indevido de palavrões)

Todas essas pessoas que sempre foram ricas não se importam de mais com o dinheiro, é exatamente o oposto, elas NÃO se importam com o dinheiro, isso nunca foi um problema, nunca faltou nem nada parecido. Elas simplesmente entram na loja que querem, a hora que querem e compram o que querem, é um movimento natural. Nada de mais.

Vamos viajar para a Europa? Vamos. Vamos almoçar em tal restaurante super caro? Vamos. Vamos isso, vamos aquilo. Porque não? Estão todos tão acostumados com esse tipo de vida que não conseguem enxergar que nem todos ao seu redor vivem da mesma forma, também não entendem que seus convites acabam excluindo aqueles que não são como eles, que toda a vez que contam o que fazem e como vivem isso quase que ofende aqueles que possuem vidas "normais".

O problema dessa faculdade é que eu me sinto vivendo em outro planeta. Eu realmente não quero vivem em um mundo onde um universitário gastar 30 reais almoçando seja normal, onde roupas de grife sejam normais, onde pessoas tenham motoristas particulares e onde sair para se divertir significa gastar no mínimo do mínimo 50 reais por noite. Me desculpem, não é nada pessoal, é só que meu bom senso não para de entrar em pane.

Não me sinto nada confortável entre todas essas patricinhas tão iguais que me deixam tonta. O que diabos eu estou fazendo aqui? Mercado de luxo é o caralho, publicitários é o caralho, marketing é o caralho. Odeio televisão, odeio consumismo, odeio gente metida. Tudo o que eu queria fazendo publicidade era escrever e ser ouvida, fazer as pessoas chorarem vendo um comercial, tocá-las de alguma forma. Não quero vender porra nenhuma, essa é a verdade. Não quero comprar porra nenhuma também (a não ser um buraco onde eu possa dormir em paz e livros). E tudo fica muito pior quando eu lembro que estou pagando por isso. E tudo fica insuportável quando percebo que ano que vem a mensalidade desse negócio vai aumentar 10% (10!!!!) e não tem nem meia dúzia de gatos pingados dispostos a protestar contra isso.

De novo: O que diabos eu estou fazendo aqui?

A única coisa que me mantem aqui é minha iniciação científica e os professores maravilhosos que me inspiram cada vez mais. Me enoja quanto os alunos dessa faculdade não valorizam os mestres incríveis bem diante de seus olhos. Alias, eles não valorizam porra nenhuma. Como podem? De verdade, como? As vezes me sinto tão frustrada que tenho vontade de dar um tapa na cara de cada um. Pelo amor de deus, acordem! Tenho vontade de vomitar só de pensar que o que meus pais gastam com a mensalidade dessa merda elitista é maior que o salário de MUITA gente. Não é possível que todos se sintam tão confortáveis com isso. Me diga, o que diabos VOCÊ fez para ter tudo o que tem? Nada, olha que coisa, você simplesmente nasceu. Onde isso pode ser certo ou normal? Desculpem, eu não entendo.

E mais uma vez: O que eu estou fazendo aqui?

Olhando para trás, porque nenhum ano é igual ao anterior


Esse ano eu pensei muito em meu passado, foi um ano longo e sofrido, talvez o pior da minha vida, mas não sei afirmar com certeza. Perdi as contas de quantas vezes minhas lágrimas se confundiram com meu sangue e eu pensei que fosse morrer, perdi as contas de quantas vezes eu fechei os olhos, sentindo tanta dor aqui dentro que eu não poderia descrever e tive certeza que não poderia aguentar mais um dia, mais uma hora ou um segundo se quer.

As vezes ainda penso que vou enlouquecer, que não há forma alguma de continuar em frente, mas admito que meu corpo e mente me surpreendem frequentemente, a cada dia que eu acordo e simplesmente consigo levantar da cama já é uma vitória. A cada novo corte cicatrizado, quando a última casquinha cai e não há um novo corte do lado, ou no outro braço ou perna para me preocupar... Isso é incrível. Deveria existir um grupo anônimo idiota de pessoas que se auto-mutilam compulsivamente, onde eu pudesse ir e falar: "Oi, meu nome é Sabrina e eu estou a três dias sem me cortar". Olá Sabrina. Deve existir em algum lugar, tem de tudo nesse mundo.

É engraçado o quanto as pessoas se acostumam, sempre que apareço com uma nova cicatriz ou um novo curativo ninguém se surpreende mais, ninguém se importa, já virou "normal". Lembro do quanto as pessoas se assustavam no colégio... Agora não é mais assim, até minha psicóloga e meu psiquiatra precisam se esforçar para não verem isso como normal em mim.

Estava certo quem dizia que a vida é uma caixinha de surpresas, eu nunca sei onde vou parar, em um dia eu posso simplesmente acordar, não aguentar minhas lembranças, meus traumas e medos e fim. Giletes, hospitais, internação, morte. Fim. Que seja.

Na verdade isso pode acontecer com qualquer um, mas imagino que comigo seja mais provável.

E aqui estou eu, sobrevivendo apesar de tudo, quem diria. Eu nem virei uma drogada maluca destinada de todas as formas a fugir da realidade, não... Me contento com meus cortes, cigarros, cerveja e calmantes. Está tudo ótimo. As vezes os calmantes demoram de mais para fazer efeito, um passo em falso e está tudo acabado, minha mão escorrega, o alívio encobre qualquer dor e sem querer eu passei um pouco dos limites. De novo. Tudo bem, tem gente muito pior do que eu, mais remédios, discursos, brigas, broncas, decepções e ameaças. Sim senhor, sim senhora. Não vou fazer de novo, meu braço dói tanto que eu nem consigo mais segurar a gilete, vou me esforçar, não vou beber, não vou fumar. Eu vou melhorar, por favor não me internem!

As brigas me perseguem, os problemas, os gritos e os dedos apontados em minha direção me acusando voltam esporadicamente como fantasmas. Eu não sinto mais nada. Será que resta algo dentro de mim que ainda não foi quebrado? As vezes tenho sonhos ruins, onde sou levada para um lugar e entregue nas mãos de homens que irão me violentar. As vezes tenho tanta certeza que esse sonho irá acontecer que basta só alguém me olhar nos olhos para que eu abaixe a cabeça e queira fazer tudo o que me mandam. Na verdade eu tenho certeza que isso ainda irá acontecer, não sei porque, eu só tenho. É algo que me persegue.

E apesar de tudo aqui estou eu, sobrevivi a mais um semestre. Quanto tempo mais eu ainda vou durar? Sempre me pergunto isso. Sempre me surpreendo com as respostas.

Eu sou a pessoa azarada mais sortuda que conheço, o fato de eu estar suportando uma faculdade até agora e indo bem ainda por cima é ótimo, é mais do que ótimo. É legal quando eu consigo pensar positivo dessa forma... É verdade que desde meu diagnóstico eu venho piorando, é verdade que existe uma tendência perigosa em minha trajetória... Mas hoje eu simplesmente não ligo, estou feliz que o ano esteja terminando.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

O que eu sou, o que querem que eu seja, o que eu já fui


Acho que se posso dizer de algo realmente útil quanto a mim mesma que aprendi nesses dois últimos anos foi a me aceitar. Não completamente, óbvio. Na verdade acho que nem existe isso, se aceitar plenamente e toda essa baboseira, acho que aceitação é algo como um processo interminável. De qualquer jeito, imagino que falo por todos aqueles que de alguma forma não se encaixam no padrão de normalidade determinado pela sociedade quando digo que existem poucas coisas tão difíceis quanto olhar para seu reflexo no espelho e gostar do que vê, seja esse espelho real ou não. É muito difícil não se esconder atrás de roupas largas, cabelo comprido e uma personalidade passiva, tímida e anti-social. É assustador não ser o que seus pais sempre sonharam ou o que se pensa sobre você. Existe uma pressão enorme camuflada em todos os ambientes onde você pisa, uma pressão para que você pareça sempre feliz, seja comunicativo com todos, simpático com todos, seja magro, bonito, educado, se vista "bem", pareça inteligente, tenha confiança, seja engraçado, se sinta sempre bem, seja sempre o mesmo. Escondido mais profundamente nessa casca de politicamente correto, esse discurso de que você só precisa ser "você mesmo", existe a expectativa de que você seja heterossexual, a qual eu vou me focar um pouco mais aqui.

Ninguém espera que você seja gay, ninguém. A não ser que você já deixe isso bem claro desde sempre, mas se você agir como uma pessoa "normal", se você se vestir como uma pessoa "normal" e se comportar do mesmo jeito, ninguém vai desconfiar de que você não seja "normal". Podemos seguir o mesmo raciocínio quanto a doenças, ninguém espera que alguém seja doente se não apresentar nenhum "sintoma". Dessa forma, existe uma pressão enorme em cima dos homossexuais que permanecem no armário, se você não parece ser, você não é. Quando eu tive certeza quanto minha sexualidade, a pouquíssimo tempo para falar a verdade, foi também quando eu saí do armário, foi um turbilhão de acontecimentos descontrolados e minha felicidade era tamanha que eu nem me importei em esconder das pessoas a minha volta minha descoberta, eu não pensei em nenhum momento o que isso poderia me trazer de consequências ruins, também não pensei nas pessoas a minha volta, não pensei em nada, e para ser sincera fico feliz de não ter racionalizado em momento algum. Por alguns meses eu quase que perdi todos meus amigos, ninguém esperava que eu fosse gay, ninguém aceitou me ver de mãos dadas com outra garota, perdi as contas de quantas vezes ouvi que estava sendo idiota, que minha namorada estava me manipulando, que eu não estava sendo "eu mesma", que eu iria me arrepender, e tantas outras coisas. As pessoas não conseguiam sentir a alegria que eu sentia, foi um enorme passo esse que eu dei, meu mundo, que sempre esteve de ponta-cabeça, foi realmente desvirado. Pela primeira vez na minha vida eu consegui me entender, eu consegui olhar para o espelho e entender o que eu via e mais do que isso... Gostar do que via.

Acho que eu sempre senti tanta pressões ao longo da vida, acho que eu fui TANTO o que se esperava de mim, que quando finalmente consegui quebrar uma corrente, quebrei todas de uma vez e saí correndo loucamente agarrando toda a liberdade que eu podia. Eu passei tanto tempo me importando com o que pensavam de mim, em quem eu deveria ser (e não quem eu era) que descobrir uma pequena parte de meu ser como eu realmente era me fez transformar todas as condições. De repente eu não ligava mais para ninguém, de repente não me importava com o que pensavam de mim, de repente tudo, finalmente, parecia fluir com tanta naturalidade que eu não conseguia entender os obstáculos que todos colocavam a minha volta. Foi uma época tão boa quanto ruim e de todas as coisas que eu aprendi, acho que a maior delas foi me aceitar. Como já disse, é muito difícil gostar de quem você é, quando você é tudo menos o que as pessoas a sua volta querem ou esperam. Meus pais tem vergonha de me apresentarem para qualquer pessoa como sendo filha deles, e não são só eles que tem vergonha de dizer que me conhecem... Mas eu estou feliz de ser quem sou, de ter cabelo curto, usar as roupas que eu uso e falar do jeito que eu falo.

Mas é difícil ter que se afirmar a todo o instante, e continuar dizendo para as pessoas que você é assim mesmo e que não vai mudar para o que elas esperam ou querem. As pessoas se incomodam de mais com a vida alheia, isso me irrita. De qualquer jeito, quando penso que sai de uma coisa confusa e sem definição para o que eu sou agora, me sinto muito feliz, por mais que eu ainda tenha MUITOS problemas, fico muito aliviada desse ser um a menos.

domingo, 20 de novembro de 2011

Clarisse e seu monstrinho - Um conto sobre abuso sexual infantil


O monstrinho crescia em suas entranhas, ela sentia, se alimentando de suas energias, ocupando seu corpo lentamente, ela sabia. Em quanto tempo sua barriga ficaria mais evidente? Um mês? Dois? Não mais do que isso. 13 anos, grávida pela segunda vez, ar irritado, infantil, doloroso, fechado. Clarisse olhou para as bonecas estendidas em sua cama, precisava matá-las todas. As roupas dos infantis corpos de plástico foram arrancadas e rasgadas pelas mãos trêmulas de raiva da menina, olhos frios e distantes. Com a ponta de um compasso Clarisse perfurou seus corpinhos, ela as amava todas. Clarisse de repente pensou sorrindo, tinha que fazer isso porque elas eram más, precisava ensiná-las porque as amava. As coisas eram assim, estava tudo perfeito.

Depois de matar suas filhas, Clarisse socou a própria barriga; ofegante, caminhou até a parede cor de rosa de seu quarto e bateu a cabeça contra a mesma com toda a força que tinha. E tudo se apagou. A pequena menina por um instante glorioso pensou ter morrido, mas quando abriu os olhos não havia luz,ou anjos, ou qualquer uma dessas coisas bonitas que se conta que as pessoas boas encontram quando morrerem. Não... Clarisse virou o rosto encarando a parede que a pouco a tinha feito desmaiar, seus olhos eram tão terrivelmente indiferentes que ninguém desconfiaria que havia um homem sobre ela, que havia aproveitado o desmaio da menina para colocá-la sobre a cama e fazer o que os homens fazem. Clarisse não ouvia o gemer grotesco do homem sobre ela, ela observava do teto aquela menininha que não era ela na cama com uma certa pena e indiferença, Clarisse estava feliz que não era ela. Clarisse tinha esse poder as vezes, de sobrevoar a vida e ficar observando os acontecimentos lá embaixo. Nesses momentos ela imaginava que era um anjo ou uma fada, ou que Peter Pan havia lhe ensinado a voar. Tudo isso era segredo, claro, ela não podia contar para ninguém seus poderes mágicos, se não eles desapareceriam. Clarisse gostava de voar, mas não gostava de olhar para baixo, não por causa da altura, mas porque as coisas que aconteciam na terra lá embaixo era muito feias para serem observadas, ela se sentia culpada por invadir a vida dos outros daquela maneira, ela não queria saber o que acontecia com aquela menina lá embaixo, não era da conta dela. É feio se intrometer na vida dos outros, mamãe sempre dizia.

Clarisse sorriu quando o homem saiu de cima dela e a cobriu com a coberta, a menina estendeu os braços para abraçá-lo e receber um beijo de boa noite e tudo estava terminado. Clarisse percebeu porque quando havia aberto os olhos não tinha visto luz nenhuma, nem anjos, nem nada disso. Ela era má, era muito má... Por isso ela não iria para o céu e quando abrisse os olhos nunca veria algo parecido com isso. Clarisse iria para o inferno.

O homem parou junto a porta por um instante. Boa noite pai, disse a menina, puxando as cobertas sobre a cabeça. Boa noite. Papai voltou junto a cama da menina e fez um carinho em sua cabeça, Clarisse sentiu os músculos de seu corpo se retraírem de medo mas continuou dizendo para si mesma que estava tudo bem. Papai gosta de fazer carinho, sorriu ela olhando para um ponto distante, mas papai não vai gostar quando descobrir que sua filhinha está grávida de novo, Clarisse faz tudo errado, ela é uma péssima filha, todos sabem disso, pensou ela consigo sentindo os dedos grossos do homem percorrendo seu corpo e parando no lugar de sempre. As vezes aqui embaixo fica tão dolorido que fica difícil andar, mas ela merece isso. Ela é uma péssima filha. Clarisse olhou para baixo enquanto flutuava no teto, aquele menina era uma menina horrível, olhe só para ela, tirando a calcinha e deixando que aquele homem entrasse nela de todos os jeitos possíveis. Havia uma palavra para isso, Clarisse tentava lembrar, pros...ti...tu...ta. Seus amiguinhos na escola as vezes a chamavam assim. Mas se eles vissem essa menina, eles parariam de chamar Clarisse disso e passariam a chamar essa menina, ela é muito pior do que ela.

Clarisse olhou para a própria barriga, tentando pensar em um jeito de tirar aquele monstro de dentro de si. Seu quarto era tão rosa que as vezes lhe dava náusea. Caminhou até a janela se debruçando sobre a mesma, dois andares, o vento estava bom, está na hora de flutuar para fora daquele quarto sufocante e ficar olhando aquela menina terrível, Clarisse queria ver outras coisas, coisas bonitas. Vou procurar minha amiga que um dia decidiu sair voando janela afora também, vou encontrá-la flutuando por aí. Talvez um pouco mais longe da superfície e mais próxima do céu, meu monstrinho deixe de ser um monstrinho. Clarisse o amava de certa forma, apesar de tudo. Foi só quando sua cabeça alcançou o chão frio de concreto que ela se lembrou que iria para o inferno.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

E agora doutor?


E agora doutor? Você disse que ela iria melhorar, você disse que para tudo existe tratamento, e agora doutor? Doutor, ela não responde ao tratamento, não está vendo? E agora? Doutor, você diz que ela não está sendo ela mesma, você diz que o cérebro dela está doente, você continua dizendo que ela irá melhorar, a cada dose aumentada, a cada novo remédio introduzido. Doutor... Você está errado, o cérebro dela não está doente, o cérebro dela É doente, doutor ela não está fazendo outra coisa se não sendo ela mesma o tempo inteiro, você não entende doutor, o senhor só fala de sintomas e sintomas, ela é um sintoma vivo, ela não sofre da doença, ela É a doença. Existe um remédio que me cure de mim mesma?

Aos poucos entendo que não existe saída, que não há como eu fugir de mim mesma, que eu estou o tempo inteiro sendo treinada para ser tudo menos eu e que isso não vai dar certo. Eu sou totalmente errada, eu penso errado, eu sinto errado, eu ajo errado, eu sei de tudo isso, mas... O que eu posso fazer? Me diga por favor, o que eu tenho que fazer para não ser assim. Me diga os dez passos, os vinte passos, qualquer coisa... Para que respirar pare de doer, para que eu consiga sobreviver a essa porra de mundo, a essa porra de vida, essa porra tudo, sem me destruir. Estamos no limite, onde eu vou parar? Doutor quanto tempo ainda vai demorar para que o senhor perceba que eu não tenho jeito? Doutora, é impressão minha ou você já está desistindo de mim? (E o pior de tudo é que tudo o que eu vejo pode ser simplesmente invenção da minha cabeça)

As vezes tenho vontade de jogar todos esses remédios na sua cara, todos os que eu já tomei, tomo e vou tomar, ou melhor, as vezes tenho vontade de engoli-los todos de uma vez, quem sabe assim eu mato o monstro que tenho em mim. Da mesma forma que veio vai embora, não é doutor? Estou esperando ir embora, estou esperando até hoje ir embora, você sabe muito bem que isso não vai embora, você deveria parar de mentir para mim e tentar falar todas essas palavras ridículas de consolo. Você sabe muito bem que eu sou um fiasco, um caso perdido, uma defeituosa, não precisa falar comigo como se eu ainda tivesse jeito, como se estivesse tudo bem. Não está tudo bem, todo mundo sabe que não está tudo bem, até eu, com minha capacidade de auto-percepção reduzida ao mínimo já entendi que eu não estou bem. Eu só quero que você seja sincera comigo, principalmente agora que estou tão confusa que não percebo mais nada, não tenho crítica nenhuma, eu preciso que você me diga. Quem sou eu? O que há de errado comigo? Você realmente acredita que algum remédio um dia vai me ajudar do jeito que deveria? Doutor... Eu não aguento mais. Tenho vontade de rir quando você fala que pensar em se matar faz parte do meu transtorno, o caso é, o que em mim NÃO faz parte do meu transtorno? E realmente... É um grande consolo saber que pensar em me matar, ver coisas, ataques de pânico, ataques de raiva, humor inconstante, irritabilidade, tendência ao isolamento social, sensação de estar sendo perseguida, ouvir coisas, sentir coisas e todas essas merdas sejam comuns no meu transtorno. Isso não faz eu me sentir melhor, caso você não tenha percebido, só faz eu me sentir cada vez mais doida.

Eu estou cansada doutor... Estou cansada de remédios, cansada de terapia e treinamento para conviver socialmente e essas merdas todas, estou cansada dessa dor no peito, minha cabeça latejante, minha inconstância, meu ódio e amor extremos, meu medo, meus cortes e meu sangue escorrendo pelos meus braços e alma. As vezes... Depois de um ataque de alguma coisa, depois de eu passar a fase do "não aconteceu nada, está tudo bem", eu paro e simplesmente penso que não há saída, eu vou acabar internada, eu sinto... Isso dói, é como se eu já estivesse morta, ser internada, por mais que meu médico e minha psicóloga me digam que não, para mim é como se o mundo tivesse desistido de mim, como se eu tivesse sido taxada de incapaz de viver socialmente, um perigo por existir, etc... Eu consigo viver socialmente, muito bem até, é só que o mundo é espinhoso de mais para mim, eu não causo mau a ninguém diretamente, mas me destruir é um vício e me destruindo eu machuco todos a minha volta. No fim da na mesma, sair cortando o próprio corpo, vendo coisas, chorando e gritando pra todo o lado não é exatamente o modelo de cidadão normal. Eu não acredito em mim mesma. Não... Já passei dessa época, ou melhor, nunca passei por essa época... Mas eu quero tanto que as pessoas a minha volta acreditem em mim, eu preciso tanto, quero dizer, acreditar de verdade... Não quero ser abandonada de novo, não quero ouvir mais nenhum "eu não aguento ficar ao seu lado, me desculpe, eu fiz de tudo, mas você não tem jeito", eu não quero. É injusto eu querer isso, eu sei que é. Se nem eu aguento viver em meu próprio corpo, como posso esperar que alguém consiga conviver comigo durante muito tempo ou "para sempre"? Mas eu quero mesmo assim... E bom, se para isso eu tiver que viver dopada, eu vou continuar dando o meu melhor, estou cansada, muito cansada, mas não há outra alternativa (se não me matar), ainda não cheguei ao ponto de me matar de verdade, ainda não. Vamos lá... 900mg dessa vez, mais 300, mais 50...

domingo, 13 de novembro de 2011

Não sentir


Se existisse um sentimento atrelado à não capacidade de sentir seria o desespero, a dor, a angustia. Mas não existe. E não há nada pior no mundo do que a ausência, a vida é cercada por sensações, sentimentos, imagens, sons e cheiros, ser privado dessas coisas é enlouquecedor. A verdade é que eu não faço ideia do que está acontecendo comigo, me sinto telespectadora, me sinto sendo jogada de um lado para o outro como se estivesse sido engolida por uma tempestade. E ao mesmo tempo que sinto isso, não sinto. Me sinto terrivelmente perdida entre meus extremos, e ao mesmo tempo, não acredito estar mau, me sinto desconfortável, porém minha cabeça me diz que isso está certo, que se sentir e agir dessa forma está certo. Eu sou assim, é assim que as coisas são. É mais do que conformismo, é uma certeza tirada do bolso, um sentimento de unidade dividida e incerta, mas ainda assim, uma unidade. Isso não é bom, nada que vem de minha cabeça é bom.

E então de repente eu sou uma psicopata incapaz de sentir ou conhecer qualquer sentimento, puramente racional, friamente racional. E então de repente eu sou emoção pura, essência, uma confusão absurda de todos os sentimentos do mundo, em todas as suas intensidades. As vezes tenho vontade de pedir para que as pessoas me machuquem, acho que mereço isso, mas quando elas me machucam, eu me encolho em um canto me fazendo de vítima, esperando não sei o que, talvez um olhar de piedade, uma mão afagando minha cabeça (nem que essa mão seja a mesma que tenha me machucado, principalmente se a mão for a mesma). Tudo não passa de um circo inútil, mas para mim, fazer parte desse circo talvez tenha um sentido, talvez eu simplesmente não tenha escolha, talvez eu seja preguiçosa de mais, talvez eu esteja pagando por algo que eu fiz, talvez a vida seja só, simplesmente, injusta. De um jeito ou de outro, estou em meio a essa confusão que eu sou, que fizeram de mim e há muito tempo não exergo saída nenhuma. O que eu mais queria na vida é ser a porra de uma pessoa normal, quanto mais as doses dos meus remédios vão ter que aumentar para que eu pareça normal? Para que eu consiga enganar decentemente as pessoas a minha volta quanto a minha sanidade?

Talvez infinitamente, talvez eu seja internada, talvez tirem de mim minha faculdade, minha vida, minhas esperanças, talvez eu esteja perto de ser carimbada como incapaz, um perigo para mim mesma (e para as pessoas que se importam se eu vivo ou morro). Hoje minha mãe me lembrou de uma das minhas crises, notei que, apesar de lembrar da raiva que eu senti naquela época, eu dificilmente lembro de meus atos, nunca lembro que costumo atirar as coisas longe quando estou descontrolada por exemplo, nunca lembro direito do que falo também, ou como eu falo. E não faço ideia de como as pessoas me veem em um momento desse, como será que eu pareço quando estou vendo coisas? Será que minha cara me denuncia? Será que pareço louca? E quando estou descontrolada? Quando estou com medo, dor ou quando acabei de me cortar? Minha mãe tem medo de mim acho, ou pena, sei lá. Por isso ela me trata como retardada as vezes. Não posso culpá-la... Deve ser triste ter uma filha como eu, que as vezes parece ter o cérebro derretido de tanta pane que dá.

Tenho pena do meu gato, que tem que aguentar minha inconstância todo o dia, tenho medo que eles cresça traumatizado, ele só tem dois meses, é um bebê ainda. Percebi que é um perigo me deixar responsável por alguém mais fraco do que eu, tenho tanta vontade de abraçá-lo, quanto de machucá-lo de alguma forma. Sorte que ainda não estou descontrolada ao ponto de fazer isso. É nessas horas também que eu me pergunto quem eu sou, ou melhor, quem eu seria se não fosse todos esses remédios me controlando. Isso me assusta e por mais que seja ruim ir em um psiquiatra todo o mês para ouvir quase sempre as mesmas coisas, me sentir uma cobaia viva da indústria farmacêutica e uma retardada por não conseguir nunca alcançar a estabilidade não importa quantas e em quais quantidades de drogas me derem... Com certeza isso é melhor do que não ter apoio nenhum, eu deveria abaixar minha cabeça e agradecer, eu sei que deveria. Mas como todo o ser humano, eu nunca vou estar plenamente satisfeita com minha condição, o que eu posso fazer? Mais deprimente do que ser taxada como incapaz, é se perceber como tal.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Não há base alguma que torne possível o mais tenro equilíbrio


Me sinto perdida, nesse momento duas mulheres fazem café enquanto conversam e eu aqui, me perguntando se estou viva. Sinto que algo vai mau, minha psicóloga me diz que algo vai mau, porém não sei dizer onde, como ou porque, me sinto anestesiada, não consigo sentir o que estou sentindo, não consigo perceber mais nada, se quer enxergar, não sei o que estou fazendo ou porque estou fazendo, meus braços, pernas e boca parecem ter vida própria, de repente me vejo em um lugar e não sei ao certo como cheguei ali ou porque eu estou ali, acho que até meu cérebro me abandonou.

Minha psicóloga pensa que é o estresse, eu me cobro de mais, porém não me sinto sobrecarregada, me sinto morta. Não consigo segurar minha vida, tudo passa diante de meus olhos como se eu não fizesse parte de nada. Não é mais questão de me salvar, é questão de me ressuscitar. Me sinto tão morta que nem a ideia de me atirar frente a um carro me anima. O que eu estou fazendo afinal? Toda essa indiferença... De novo algo morreu aqui dentro e eu não me lembro como me levantei em todas as outras vezes.

A vida continua, eu continuo, mas o que eu estou fazendo? Onde estou? Essa decididamente não sou eu, acho que morri e esqueceram de avisar meu corpo, houve um mau entendido, algo não vai bem e eu não sei dizer o que é. Sinto que quanto mais forte meu coração bate mais próxima da morte eu estou. Minha psicóloga faz um trato comigo, vamos melhorar, vamos nos esforçar mais, vamos. Eu concordo e por um instante tenho a ilusão de que é possível melhorar de novo, saindo de lá o peso de ser quem sou cai em minhas costas como uma sentença, e a única coisa que eu lembro da minha terapia é que o que eu tenho vai me acompanhar durante a vida inteira e que eu sempre vou precisar prestar o máximo de atenção possível em todos meus comportamentos e sintomas para tentar prevenir uma nova crise. Sempre. Eu preciso prestar atenção nos meus limites ridículos, preciso lembrar que tenho que me respeitar, me preservar e todas essas coisas ligadas a mim, preciso prestar atenção às pessoas a minha volta, porque qualquer movimento não pensado trás para mim consequências terríveis, preciso ir com calma, aceitar meu tempo, minha lerdeza e incapacidade de funcionar frente a problemas, preciso ficar longe de coisas afiadas, controlar minhas mãos, meu nervosismo e medo irracional de qualquer coisa, preciso, enfim... aprender a viver... mas eu simplesmente não consigo, eu sou burra de mais para lidar com a vida, sou fraca de mais, lerda de mais, sensível de mais.

A única coisa que eu posso dizer que sou boa é fingir que está tudo sob controle. Está tudo sob controle, é só uma peça do meu cérebro que foi arrancada e nunca mais encontrada. Só isso. Agora vivo sem base, parâmetro ou equilíbrio, se é que se pode chamar isso de vida.

Para uma menina


Toda vez que te vejo desfilando pelo prédio, pelas escadas, elevadores e corredores, sinto um aperto desconcertante em meu peito. Dez, onze anos, pernas finas descobertas, ainda sem vestígio nenhum de seio, rosto fortemente maquiado, salto alto, olhos grandes de criança, olhar enigmático, passado intragável, presente incerto. O que fizeram com você menina?

Lembro de seus seis, sete anos, a menininha esquisita, dada, de irmão gago e problemático, olhar malicioso desde aquela época, fala rápida e nervosa, esquisita. O que fizeram com você? Os boatos sempre me assustaram, fizeram com que eu sentisse repulsa por você, repetisse para mim mesma que não era verdade e pior, se fosse, significava que você não valia nada, que a culpa era sua... Uma criança, eu também, uma criança.

Veja como são as coisas, negar você é negar a mim mesma, te culpar é me culpar. Sinto como se, de certa forma, sua pequena vida nada inocente, fosse uma continuação da minha, uma continuação talvez pior, talvez "melhor", não sei dizer. De um jeito ou de outro, indiscutivelmente, sinto em seus olhos o inferno que você vive, ou melhor, eu o reconheço. E só por essa sensação existir, esse reconhecimento, já me faz querer te arrancar daquelas garras, mãos, corpos, limpar a maquiagem de seu rosto e te dar uma boneca, te dar uma infância que você nunca pareceu ter, uma chance para sair da escuridão, ver o sol, brincar e todas essas coisas. O que fizeram com você menina?

Eu rezo todos os dias para um deus que eu não acredito, para que alguém te salve, para que sua vida esteja melhor hoje do que estava naquela época. Nós guardamos os segredos ruins em um lugar distante de nossa consciência, para que eles não nos destrua. Eu rezo para que daqui a alguns anos, quando o segredo se tornar pesado e insuportável de mais, você não apareça com cicatrizes em seus pulsos e braços. Ou melhor, rezo para que os boatos sejam só boatos e que seus olhos tristes, profundos e assustadores sejam só algo da minha cabeça.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

19 anos - O que eu ainda não aprendi


Esse ano eu não aprendi a valorizar minhas melhoras, por que a cada dia melhor, mais perto eu estou de uma nova crise. Esse ano eu não aprendi a confiar nas pessoas, porque confiar significa ser traída em algum momento, também não aprendi a falar, porque falar significa ser mau interpretada, significa fazer o outro sofrer, despedaçar seu coração e tantas outras coisas. Nesse meu décimo nono aniversário eu ainda não aprendi a pedir ajuda, a me respeitar, me valorizar e me perdoar. Ainda não aprendi a encarar meus medos, admitir meus erros e deixar no passado o que é passado. Ainda não suporto a ideia de ficar sozinha, de ser criticada, de ter minhas feridas expostas (mesmo que isso seja necessário para curá-las) e de existir. Nesse meu aniversário ainda não aprendi a caminhar sozinha, a controlar meus nervos, meus braços, meus dedos. Minha coleção de cicatrizes continuam aumentando lenta ou rapidamente, não importa. E eu continuo sendo eu, com todos os defeitos, dúvidas e confusões.

Até hoje eu não digo tudo, eu nunca digo tudo. Ainda não aprendi que a perfeição não existe e que eu não devo procurá-la, não aprendi a amar o mundo ou a vida (apesar de eu amar algumas vidas ao meu redor), não aprendi a buscar mais soluções que eu já não buscasse antes, não aprendi a ficar mais forte, a suportar mais a dor ou o que quer que seja. Não reconheço meus limites, continuo sendo mal interpretada e tratada como objeto. Nesses 19 anos sinto como se fosse velha de mais para ser considerada adolescente e nova de mais para ser considerada adulta, há tantas coisas a serem aprendidas que já me sinto cansada. Desde o último ano, não sei dizer se as coisas pioraram ou melhoraram, tenho mais medo do amanhã hoje, do que tinha ano passado, tenho mais segurança quanto ao meu relacionamento hoje do que no ano passado, mas de um jeito ou de outro, sinto que a cada dia me descubro mais, quer seja isso bom ou ruim, mas poderia dizer também que a cada dia me perco mais, é questão de ponto de vista. Mas o fato é que a cada dia eu mergulho mais profundamente dentro de mim, hoje eu consigo voltar ao passado com menos medo, desespero ou dor, consigo me observar mais detalhadamente, entender meus sentimentos e atitudes, apesar de ainda não conseguir controlá-los muito bem.

Acredito que essa seja minha "grande evolução" esse ano, nada de confiar mais, aprender a ser mais sociável e todas essas babaquices, a cada dia eu desconfio mais das pessoas, para ser sincera, a cada dia elas me provam cada vez mais que eu tenho razão para me fechar e permanecer há uma distância segura. O que eu aprendi esse ano foi a me conhecer e, é verdade, a gostar mais das pessoas que ainda não me deixaram de lado, apesar de sentir que a grande maioria dessas ainda vão escorregar da minha vida como todas as outras. Na verdade isso é natural, o problema é que eu ainda não aprendi a lidar com isso de forma saudável. De um jeito ou de outro, tenho 19 anos e continuo sendo uma garotinha chorona, ainda há muitos anos pela frente para me provarem que eu estou errada.

Existir por existir - o deus e o demônio que habita em todos nós


A vida passa diante de seus olhos, escorrega pelo seus dedos e abandona seus ouvidos. O que eu estou fazendo? Não sei, ninguém sabe. Aos olhos alheios tudo parece fazer sentido ou ter um propósito, aos meus tudo não passa de idiotices. Mas para esses idiotas, a ilusão de felicidade os satisfaz, enquanto para mim a realidade dura e fria ao invés de abrir meus olhos parece me tornar mais cega que a pessoa mais cega da face da Terra. Quem é o idiota afinal? É nesses momentos que entendo porque o não questionar e o conformismo são louvados como fé e humildade, porque a fraqueza é louvada como força e porque o mundo inteiro é um avesso contraditório.

Existir só por existir, sem grandes motivos, "missões" de vida ou sei lá o que, tem sua bênção e sua maldição por trás, não me sinto mais vigiada por um ser invisível e todo poderoso, não me sinto devedora de nada, não tenho mais vergonha e medo de ser quem sou, porém, agora, quem vigia meus passos sou eu mesma, o peso da culpa e dívida repousa sobre mim, como se ao invés de ser escrava de um deus, eu tivesse me tornado escrava da minha própria mente. Não há ninguém mais que eu possa culpar pelo que me acontece na vida se não eu mesma, não há ninguém mais que eu possa pedir por dias melhores se não para meu próprio esforço e atitudes. Tudo isso, apesar de me soar como uma existência mais sincera e realista, me pesa, me torna solitária.

Mas eu escolhi viver assim,prefiro ser meu próprio demônio e salvação do que sentar e esperar tudo cair do céu, ter a ingenuidade de culpar um ser invisível pelas meus erros, azares e desencontros. Acredito que isso seja ser livre. Liberdade não é fazer o que se quer, mas assumir a responsabilidade pelas suas escolhas e atitudes, liberdade é mais do que correr sem nunca encontrar um muro a frente, é poder e ter forças suficiente para derrubá-los. Espero um dia ser realmente livre.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Para onde as verdades sejam opostas


Vamos fugir? Viver de ar em um mundo inexistente, acordar sorrindo para uma vida sem propósito (e por isso mesmo maravilhosa). Vamos fugir, vamos, viver em uma realidade de sonho, onde respeito e aceitação dá em árvore, onde crianças são felizes e lâmpadas permanecem no teto. Vamos fugir para onde cada pessoa tenha a capacidade de cuidar da sua vida, onde não exista medo que não seja só os dois segundos de susto que a pessoa que te ama te deu para rir um pouco. Vamos fugir, vamos! Para onde não exista adultos nem regras sem sentido, para onde o amor não venha em forma de socos, chutes, tapas e abusos quaisquer. Vamos fugir para onde crianças possam ser crianças, para onde becos e lugares onde coisas ruins acontecessem não existam.

Não solte nunca minha mão, me tire daqui, me salve. O mundo sempre me pareceu tão hostil, vamos fechar os olhos por um instante e esquecer que vivemos o que vivemos, que somos quem somos, as lágrimas que choramos, as acusações e dedos apontados em nossa direção, vamos esquecer por um instante os gritos e de todos os nomes que já fomos chamadas, todas as coisas ruins que ouvimos, os olhares duros e infinitos julgamentos. Vamos esquecer o futuro também e os obstáculos intermináveis. Vamos fugir, vamos! Por um dia ou dois, um mês, um ano, para sempre. Um segundo. Para onde nada exista e as verdades sejam opostas.

Me deixe viver por um instante uma vida onde tudo se encaixe perfeitamente, onde meu maior problema seja qualquer coisa fútil e ridícula, onde eu invente inimigos e problemas e os desinvente quando bem entender. Me deixe viver um dia sem cicatrizes, sem choro, sem medo, desespero ou dor. Me deixe por um instante entender tudo, costurar meu coração como se nada nunca tivesse acontecido e esquecer que as lâminas são mais minhas amigas do que muita gente.

Vamos fugir vamos. Para onde você seja feliz e eu não seja quem sou, para onde você não tenha medo e eu consiga fazer todas as coisas que você me faz sentir. Vamos fugir vamos, para onde o tempo não exista, para onde lâmpadas permaneçam no teto e crianças sejam crianças. Vamos fugir?

domingo, 30 de outubro de 2011

Para que as larvas existem?


Era uma vez uma pequena larva, lerda e feia, que andava pelo mundo perdida e sem propósito. Para que as larvas existem? Ela perguntava para todos os que cruzavam seu caminho e ninguém sabia responder. Para que as larvas existem? Nenhuma resposta, só olhares desviados e afastar de corpos tamanha sua feiura. E dessa existência triste e solitária ela se cansava dia após dia. Para que as larvas existem? Ninguém sabia responder. Havia algo nas outras larvas que ela não conseguia entender e acompanhar, como se elas soubessem de algo que ela não soubesse, como se elas sim tivessem um propósito e não quisessem compartilhar com nossa pequena larva perdida. Tudo soava muito injusto.

Dizem que deus criou todas as criaturas, para a larvinha deus parecia um tanto quanto maldoso, ela não conseguia ver motivos para existir. Porque as coisas eram do jeito que eram? Porque ela tinha que ser tão feia e tão lerda? Para que ela existia? E havia os pássaros, famintos, rápidos e belos, tentando de todas as formas comer nossa larvinha. Tudo soava muito injusto. Os pássaros são tão bonitos, todo mundo ama pássaros, eles cantam e pulam daquele jeito bonitinho, eles voam lá no céu, vêem as paisagens mais bonitas, sentem o vendo passando por suas penas... Como deve ser bom ser um pássaro. Os pássaros existem para ser feliz. Para que as larvas existem? Para serem comidas pelos pássaros, é isso. Que existência triste. Elas são tão feias, tão lerdas e sem nenhuma qualidade. Tudo soava muito injusto.

Todos os dias a larva se cansava dessa existência sem sentido e dolorosa, até que em uma manhã ela decidiu não se mexer mais, esperar a morte talvez, deixar que os pássaros a comessem viva. E ficou lá parada, durante tanto tempo que nem se lembrava mais. Talvez eu já esteja morta, ela pensava consigo, talvez se eu abrir meus olhos agora eu vou estar no céu. Larvas vão para o céu? Talvez não... Só consigo imaginar criaturas bonitas no céu. De um jeito ou de outro nossa larva de repente se sentiu inquieta, abriu os olhos em meio a uma escuridão, tentou se mexer e viu que estava cercada por algo. Talvez eu esteja na barriga de um pássaro. Se mexeu com mais força e viu uma fenda se abrir no que quer que estivesse a sua volta, seus olhos se machucaram com a luz forte. Acho que realmente estou no céu. A larvinha alargou a fenda, saiu pela mesma e se sacudiu tentando exercitar seus músculos enferrujados depois de tanto tempo de desistência, foi quando ela percebeu algo errado. Ela agora tinha pernas! E mais do que isso, havia duas coisas grandes e desajeitadas nas suas costas, leves e frágeis. A larvinha as mexeu insegura. Eram asas! Eram asas! Ora, vejam só.

Nossa pequena larvinha saltou do galho que estava, feliz da vida, batendo suas novas asas e experimentando o vento pelo seu corpo, a beleza da altura, a sensação da velocidade. Eu descobri para que as larvas existem... As larvas existem para virarem borboletas. E foi em meio as piruetas no ar que o sorriso na nossa pequena borboleta voltou a se apagar. Para que as borboletas existem? Qual o sentido da beleza, das asas, da velocidade? Se não serem comidas por pássaros?

sábado, 29 de outubro de 2011

Talvez meu médico tenha razão


Tudo parece muito irreal nesse momento, como assistir um filme, ver tudo passando diante de seus olhos de um lugar distante e intocável. Não parece vida, não parece verdade, não parece nada e normalmente eu sinto o que vai acontecer, se eu vou melhorar ou se eu vou piorar, mas no momento não sinto absolutamente nada... E sentir nada não é paz, é vazio, é ausência. Eu não quero ser interrompida, eu não quero ter que pensar no que é melhor para mim, eu não quero olhares preocupados e questionadores, cérebros trabalhando incansavelmente em busca de respostas e soluções, não quero mãos estendidas, desistências, ameaças. Eu quero um quarto escuro, um campo aberto, um pouco de tinta para pintar meus demônios, livros para que eu possa esquecer quem eu sou, nenhuma pessoa por algum tempo, para que meu coração não dispare assustado, para que o buraco que eu tenho aqui dentro não doa. Eu me sinto estranha, mais estranha do que o normal, uma consciência de si diferente, diferente de todas as outras.

Eu realmente não sei o que fazer, apesar de ter uma lista em mãos do que devo fazer, eu não acredito na lista, não confio na lista, ela parece errada, as coisas não são tão simples assim. Talvez seja o começo de uma nova crise, uma crise nunca é igual a anterior, há sempre sintomas novos e novas intensidades, imagino que um dia não vá haver mais sintomas que eu não tenha passado por, então meu transtorno me dará trégua, e tudo ficará bem. Mas no momento, eu nunca tive tantas crises nervosas e ataques de pânico quanto agora, da mesma forma que em junho eu nunca havia tido tantas alucinações e sintomas de despersonalização. De um jeito ou de outro... Estou tendendo ao conformismo, como sempre acontece quando eu pioro, desistir, parar de me mexer, deixar a vida (ou morte) seguir seu curso normalmente e como sempre, eu não vou desistir porque o pior vai passar antes que eu atinja meu limite. E assim as coisas vão caminhando, como uma montanha russa.

Meu médico quer o equilíbrio, mas eu não consigo aprender o que isso significa. Cada vez mais eu acredito que tudo isso faz parte de quem eu sou, quer seja isso bom ou ruim. Estou realmente cansada de correr atrás da normalidade, desse tal de equilíbrio, da felicidade e todas essas coisas. Eu sei que dizer "eu sou assim e pronto" é uma desculpa infantil para não sair do lugar, para não tentar mudar, mas no momento meu cérebro está tão cansado que acreditar nisso está me conquistando. E ao mesmo tempo, estou cansada de "ser" assim, terrivelmente cansada, ser eu é doloroso de mais, pesado de mais, trabalhoso de mais, eu quero mudar, mas sair do lugar dói. Eu realmente não sei o que fazer, se não assistir a vida ir passando diante de meus olhos como um filme, onde eu não tenho controle ou participação. Talvez meu médico tenha razão.