"A vida é aquilo que você faz daquilo que te fizeram"

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Tentando ser racional


Eu me esforço de mais, me controlo de mais, sou paciente de mais, escuto de mais, calo de mais, faço de menos. Por isso e por tantos outros motivos eu tendo a viver sempre no limite. Culpe meu transtorno se quiser, borderline significa limítrofe, no limete, na fronteira. Mas culpar meu transtorno é a mesma coisa que me culpar, não dá para se separar uma coisa da outra. Me culpar é dizer que eu estou onde estou por fazer algo errado. Me culpar é pegar os pecados dos meus monstros (nesse caso não o monstro que há dentro de mim, mas os que andam pelo mundo) e atribui-los a mim.

E no entanto eu não deixo de ter culpa. Minha inanimação, meu pessimismo, minha incapacidade de acreditar em mim mesma me tornam quem eu sou, fragil, insegura, medrosa, o que contribui, querendo ou não, para eu permanecer sempre no mesmo lugar. Porém, eu sou quem sou, assim como todo mundo, pelas coisas que me aconteceram ao longo da vida, pensando dessa forma é fácil tirar a culpa das costas e se acomodar, mas eu não consigo fazer isso. Eu sei que sou culpada, eu sei que deveria ser melhor, que deveria ter mais força e melhorar sempre, porém, pensando dessa forma, eu entro no ciclo que faz com que eu exija de mais de mim mesma e quando eu não consigo o que eu penso que deveria conseguir, ou quando eu imagino que não estou sendo boa o bastante, eu me frustro. E dessa forma vou me frustrando e me exigindo cada vez mais, em um ciclo sem fim.

As pessoas a minha volta as vezes não colaboram também, mesmo que inconscientemente. Minha baixíssima autoestima faz com que eu tenha dificuldade de colocar minha opinião frente a um grupo, eu falo pouco e com o tempo as pessoas vão esquecendo de que eu tenho uma opinião e que eu tenho o direito de escolher o que eu acho que é melhor para mim mesma. Eu dou abertura para que elas sejam egoísta, e elas o são obviamente. Em brigas, as pessoas tentam sair com vantagens sobre as outras, eu, ao contrário, procuro sair com desvantagem para que os outros possam sair com vantagem e continuem a gostar de mim. E sempre parto o pressuposto de que o outro é superior a mim e a qualquer momento pode me abandonar. E existem poucas coisas no mundo que me assustam tanto quanto a possibilidade de ser abandonada. Eu faria (e faço) de tudo para não passar por isso.

É nesse contexto, onde cada vez menos as pessoas me escutam ou se preocupam com o que dizem para mim (já que eu não demonstro nunca opinião nenhuma, desconforto ou irritação para com as pessoas que eu me importo), onde eu exijo de mim mesma cada vez mais, onde eu me sinto usada como um cachorro pela grande maioria das pessoas, onde a culpa sempre paira sobre mim, onde todos sempre jogam seus problemas para cima de mim, de modo que não sobre tempo para eu resolver os meus... É nesso contexto em que eu chego ao meu limite. Em silêncio, discretamente, passionalmente... Eu vou chegando ao meu limite. Todos reclamam na minha orelha e eu em silêncio observo o mundo perder seus contornos e as coisas deixarem de fazer sentido... Ninguém percebe, ninguém parece se importar... Enquanto eles tiverem o que querem, um cachorrinho bonzinho, compreensivo e bom ouvinte, eles nunca vão reparar que tem algo terrivelmente errado.

É só a partir do momento em que eu paro de ouvir, em que eu perco essa capacidade e perco o controle sobre meus atos e falas... Que as pessoas percebem, que as pessoas se importam. Antes disso, antes delas pederem seus benefícios, ninguém se quer se questiona se o que está fazendo é certo ou errado, justo ou injusto, ninguém se quer pensa na possibilidade de parar 5 minutos para tentar entender a visão do outro, sem preconceito ou o que quer que seja, só... se colocar no lugar do outro lado da moeda, só isso. Ninguém faz isso.

As pessoas esperam de mais e nem se tocam o quão egoístas estão sendo - Preciso ser egoísta também


As vezes me pergunto como tudo isso começou e como eu cheguei onde estou agora. Não sei ao certo como vivi, como sobrevivi, como simplesmente fui deixando minha vida e alma passarem por mim como se não fossem nada. Onde estou? Onde me perdi? O que devo fazer para voltar quando o que eu menos quero é voltar? As pessoas passam por mim, me tratam bem, tentam se aproximar e eu continuo sempre com a sensação de que estou sendo usada. Ninguém está aqui comigo, aqui dentro de mim, não há nada, a não ser uma solidão profunda e um cansaço de mim mesma. Eu converso com minhas paredes, com meus botões, com pessoas desconhecidas e no fim com quem eu estou sempre conversando é comigo mesma, na minha cabeça meu monstro se mostra inquieto, irritado com minhas atitudes, me repreende, exigindo de mim algo que ele é, não eu, e eu reclamo de nunca ser boa o bastante para ninguém, de não conseguir ser perfeita para ninguém, de que ninguém se orgulha de mim, que ninguém isso, que ninguém aquilo. Quando o problema é que quem eu não consigo convencer de que sou boa o bastante sou eu mesma, que quem não se orgulha, sou eu, que quem nunca me aceita, sou eu.

É frustrante.

Estou cansada de me aguentar, de ter paciencia comigo mesma. Estou cansada de aguentar os outros, de ter paciencia com todos. Estou cansada de me ouvir reclamar para mim mesma e de ouvir os outros reclamando para mim. A vontade que eu tenho é que fugir, fugir de mim, fugir de todos, de gritar, gritar com todos e comigo mesma, de bater, de machucar, de ofender, de destruir. O problema não é meu, o problema não é meu! Não quero eles para mim, não quero resolver nenhum, não quero se quer pensar neles ou que passem perto de mim. Pelo amor de deus... Se eu consigo controlar a grande maioria dos meus atos e falas, qualquer idiota consegue. Me irrita o fato de todo mundo falar comigo como se eu fosse um padre e eles estivessem se confessando, me irrita o fato de ninguém medir as palavras ao falar comigo, me irrita o fato de ver pessoas descontanto sua raiva, irritação, ou chatisse nos outros, me irrita o fato de todo mundo esperar que eu fique do lado de alguém, que eu compreenda perfeitamente e apoie qualquer coisa.

Minha natureza passiva me irrita. O fato de eu abaixar a cabeça e aceitar a reclamação de todos. A vontade que eu tenho é mandar o mundo calar a boca e parar com todos esse problemas idiotas para cima de mim. Foda-se! Não quero saber. Não concordo com você nem com ninguém, porque deveria? Só me deixem aqui quieta, não quero saber de nada, me deixem em paz. Vocês não me vêem brigando com ninguém, vocês não me vêem reclamando para ninguém, muito menos descontando nos outros. As pessoas falam de mais, reclamam de mais, exigem de mais, querem atenção de mais, serem ouvidas de mais. Querem tudo para elas, nada importa a não ser elas mesmas.

Se eu estou brava, tenho o direito de estar brava e ser grossa com os outros, se eu estou triste, tenho o direito de reclamar para os outros, se eu acho que fui injustiçada, tenho o direito de querer ser defendida e apoiada, se eu me sinto angustiada, tenho o direito de esperar que todos me escutem, etc, etc, etc. Pelo amor de deus! Eu não aguento mais, são todos falando de todos o tempo inteiro. Pelo amor de deus, não quero saber da sua vida, não quero saber de seus problemas, não quero saber de te consolar, te dar conselhos ou sei lá o que. Vamos... Sei lá, ficar quietos, falar de coisas que de nada tenham a ver com nossas vidas pessoais, de histórias, qualquer coisa. Mas pelo amor de deus NÃO fale de você. Estou cansada, preciso de férias.

Espinhos - A menina e a flor


Existe uma flor em algum lugar no mundo que possui muitos espinhos, tantos que quando ela desabrocha suas próprias pétalas se machucam e se rasgam na floresta pontiaguda. É uma pena, as pessoas pensam, uma flor tão bonita que peca no desespero de se defender, machucando a si mesma. Quem olha de longe sente vontade de se aproximar na mesma medida que tem medo, ela parece tão delicada e tão agressiva, tão maravilhosa e tão terrível. Pobre flor.

Um dia, meio que ao acaso, uma garota passou pela flor e esta lhe chamou atenção. Como será a flor sem todos esses espinhos a trespassá-la? Talvez seja muito mais bonita, talvez ela consiga viver muito melhor sem tudo isso impedindo que ela respire. Pobre flor. Mas como afastar esses terríveis espinhos? Como impedir que eles cresçam? A menina se agachou e ficou ali, olhando as pétalas machucadas da florzinha, e pensando. Ninguém nunca tinha tido a coragem se quer de encostar naqueles terríveis espinhos, porém a menina arriscou, imaginando que valia a pena se machucar pela pequena flor. Qual foi sua surpresa quando descobriu que os espinhos eram quase tão frágeis quando a própria flor! Ora.. Mas isso não fazia sentido. Por que a plantinha se esforçaria tanto para criar tantos espinhos, por que poria em risco a própria vida para criar algo que não a defendia de nada?

A garota, intrigada, retirou facilmente todos os espinhos que machucavam as delicadas pétalas da flor e ela ficou ali, meio murcha, muito rasgada e arranhada. A menina sorriu vitoriosa, agora a florzinha podia respirar. Logo ficaria grande e bonita, talvez crescesse o suficiente para sair do meio dos espinhos, ficar a cima deles e não ser nunca mais sufocada.

No dia seguinte, quando a garota passou novamente pela plantinha, não havia mais flor. Ela não soube entender o que havia acontecido, durante muito tempo continuou voltando ali na esperança de ver a pequena flor novamente, porém ela nunca voltou a crescer. Agora não restava mais nada a não ser o amontoado de espinhos sem sentido.

Se a flor pudesse falar ela explicaria que os espinhos serviam para mantê-la em pé, que os cortes e machucados em suas pétalas eram para ela um mau necessário. Mas ninguém soube compreender, as pessoas acreditavam que os espinhos eram um erro, que tornavam a flor feia, eles não entendiam, eles não sabiam ver que essa era a forma que a pequena flor encontrou para viver, que eles não eram para assustar os outros, muito menos para machucá-los. Não passavam de muletas para a fragil flor, não era intenção dela que suas pétalas fossem perfuradas ou que isso afastasse as pessoas. Eram só uma vontade enorme de poder existir. E a pequena flor nunca mais cresceu.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

A troca - Sobre dividir sentimentos, vidas, problemas


Tenho medo da troca. O que te faz bem, sempre te faz mau e o que te faz mau, te faz mais mau ainda. E eu tenho medo de amarrar minha linha a de qualquer pessoa, de criar vínculos, de me aproximar, de abaixar minhas muralhas, me cansa, me dói. Sangra sem parar. As vezes me sinto mais calma quando penso que no mundo só existe eu, as vezes entro em pânico ao me olhar no espelho, mas de um jeito ou de outro as pessoas me assustam, me intrigam, me irritam, eu as quero só para mim, eu as quero o mais distante possível. Elas me decepcionam a medida que eu decepciono a mim mesma, porém transfiro a decepção que tenho do mundo para mim mesma e em mim afogo qualquer dor, qualquer choro, qualquer raiva. E assim, contribuo cada vez mais para que no mundo, eu só enxergue a mim mesma, ou enxergue todos menos eu mesma, no fundo as duas coisas são a mesma coisa.

Eu reclamo da minha inexistência, da morte lenta e torturante que é minha vida, mas a coisa que eu mais sinto no universo é meu coração batendo, meus sentimentos descontrolado e desregulados. Estou morta ou viva de mais? Não sei... Só sei que o contato com o outro me causa estranhamento, quem são essas pessoas, o que querem, o que pensam, para onde vão? Eu as quero descobrir, eu quero conhecer seus piores segredos e seus maiores medos, assim fujo de mim, e me encontro logo ali. Em todos eles, em todas as histórias, em todos os sentimentos, estou logo ali. E eu viro as costas e vou para o outro lado, fugindo de todos na esperança de me esquecer em algum deles, inutilmente. Quem sou, o que quero, o que penso, para onde vou?

Fica difícil identificar se estou falando comigo mesma ou com alguém, se odeio alguém ou o que lembra a mim mesma nesse alguém, se eu amo alguém ou amo nesse alguém o que eu queria ser. Fica difícil saber se quer se existo, se quando olho no espelho vejo a mim mesma ou a outra pessoa, estranha, desconhecida. Eu não sei. As pessoas me assustam porque vejo nelas algo que existe dentro de mim, é natural, mas assustador. Fecho os olhos e finjo que não existo, que minha vida é linda. Mas quando os abro, há sempre alguém para me lembrar da realidade. Com suas próprias histórias, problemas e lágrimas... Que me lembram as minhas, e que não quero lembrar, não quero sentir, não quero voltar, não quero chorar.

Que fique longe de mim qualquer um, que os problemas se mantenham distantes e irreais, que ninguém me mostre nada do mundo, que eu durma e nunca mais acorde. Mas não me exponha com sua dor, não me denuncie, não me faça abrir os olhos. Não, não... Ser egoísta é a essência dos que conseguem sobreviver. Eu quero sobreviver.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

A cegueira e as condições para se suportar a vida


As vezes me pergunto qual o sentido do mundo existir, me pergunto, se é que deus existe, o que ele tinha na cabeça quando inventou tudo isso, o que ele ganhou com isso, qual seu objetivo, onde ele quer chegar com uma coisa dessa. Não faz sentido. Quanto mais eu penso, menos acredito que algo deliberadamente tenha criado o mundo e se algo criou o mundo, esse algo, necessariamente, tem algo de cruel e sádico. Quando olhado de perto, o mundo não é nada bonito, nada maravilhoso ou milagroso. Não... É muito fácil achar o mundo bonito, é muito fácil acreditar que tudo tem um porquê e que estamos aqui para comprirmos uma “missão”. Difícil é abrir os olhos e perceber que nada é bonito, que não existe um porquê, que a justiça não passa de algo ineficiente e ilógico criado pelo homem e que nascemos sem propósito nenhum e morreremos da mesma forma.

Não existe nada nos protegendo, nada que nos recompensará pela nossa dor e sofrimento, não existe outra vida depois dessa, não existe castigo eterno para seus inimigos, nem recompensa eterna para quem você julga bom. Tudo não passa de idéias egoístas criadas para nos consolar. É muito fácil se colocar no lugar da vítima, da santa, da que vai ser recompensada, da que deus ama e proteje, da justa, boa e caridosa, da que nasceu para fazer algo de importante no mundo e fazer a diferença. É muito fácil e por mais que essas idéias quase que infantis faça bem para a grande maioria das pessoas (tanto que a incidência de doenças como a depressão sejam menores entre os religiosos), eu a acho ridícula. Quando eu costumava ir na igreja e tentava acreditar nessas coisas, eu sempre me perguntava porque aquelas pessoas dentro da igreja mereciam o céu e não as pessoas de fora, me perguntava o que as tornava melhores, e mais, o que as fazia acreditar que eram melhores, que eram mais puras e santas, mais boas. Por que? Porque usavam saias? Porque oravam? Porque não falavam palavrão e não faziam sexo antes do casamento? Isso as tornava melhores? Porque deus julgaria alguém tatuado como pior e menos merecedor da “felicidade” eterna que um não tatuado? Aliás... Porque deus julgaria qualquer pessoa? Se todos possuem o céu e o inferno dentro de si, admitindo e reconhecendo ou não.

Quem julga afinal? Quem segrega? Quem acredita ser melhor? Será que deus diz isso ou será que são os homens que o fazem? Acho essa idéia arcaica tão... humana, tão errônea e contradizente para ser de algo dito divino e perfeito. Se você abrir um pouquinho os olhos você vai perceber o quão iguais são todos os seres humanos, o quão patéticos e vaidosos, cheios dos mesmos defeitos. Como algo seria capaz de julgar qualquer pessoa melhor ou pior, se bem lá no fundo pensamos e sentimos as mesmas coisas. Existe toda uma diferença complexa em ser e parecer ser. Só porque alguns parecem mais bons do que outros, não quer dizer que realmente o sejam. Conheça alguém, qualquer pessoa, bem a fundo que você perceberá como todos possuem os mesmos “defeitos”, que eu prefiro nem chamar de defeito, mas caracteristicas inerentes ao ser humano. Ou melhor! Conheça você mesmo bem a fundo, com sinceridade verdadeira, que você vai perceber que não é muito melhor do que qualquer assassino, enganador ou ladrão. Não, você não é.

Eu sei que é difícil de enxergar, as pessoas possuem a mania de verem só seus lados, de justificarem seus próprios atos com as mais diversas desculpas e ao mesmo tempo não aceitar qualquer desculpa do próximo, de julgá-lo sem nem um pingo de preocupação com a investigação de sua natureza, passado ou razões. Eu não suporto pessoas apontando para outras como se elas fossem santas e não errassem exatamente da mesma forma. O que muda é só o contexto, a forma particular de cada um de fazer a mesma bosta. E ninguém percebe, é incrível. As pessoas são tão éticas e justas quando se trata dos outros e tão cegas quando se trata delas mesmas.

As pessoas me perguntam porque eu me coloco para baixo, porque eu me julgo má e sou incapaz de culpar meus malfeitores. Ora... Como posso julgar qualquer erro de qualquer pessoa se sei que se estivesse no lugar deles muito provavelmente faria a mesma coisa? É questão de ser realista, de abrir os olhos. Se condene antes de apontar o dedo para os outros, seja ele quem for, seja o crime que for, não importa. Eu sei que vocês não vão conseguir, porque mesmo os que se culpam, se culpam em busca de alguém que diga “a culpa não é sua”, alguém que afague sua cabeça e diga que você não fez nada de errado. É difícil fugir da vaidade de se colocar em um lugar favorável. Eu também faço isso, o tempo todo, mas me orgulho de não buscar consolo em idéias fantasiosas e toscas, nem em acreditar que sou melhor do que os outros (porque quer você adimita ou não, você acredita SIM que é melhor do que os outros).

Mas talvez eu esteja errada. Eu sou doente, minha visão é a minoria e é a maioria que sempre tem razão. Por mais que a minoria se orgulhe de ser minoria e se ache superior por isso também (ou seja, eles fazem a mesma coisa que a maioria, só que com opiniões diferentes). Talvez o certo seja as pessoas acreditarem que são boas de mais, que são especiais e diferentes, que o mundo vai sentir falta delas quando elas morrerem, que elas serão compensadas de tão justas e certas que são. Talvez sem isso o ser humano enlouqueça, como eu. Talvez sem isso todos se matem, talvez ninguém aguente encarar a dura realidade de que eles são ninguém, de que são exatamente iguais a todos e que nunca irão se destacar, que nunca ninguém dará a mínima para eles. Talvez ser cego seja uma defesa criada pela natureza para que os homens suportem a vida.

domingo, 25 de setembro de 2011

Toca


(Texto escrito para um trabalho de Lingua Portuguesa, baseado na obra Cidades Invisíveis de Ítalo Calvino)

Toca não é o que você vê em um primeiro momento, não se trata dos caminhos confusos e escuros como um formigueiro, as galerias espaçosas em contraste com o sufoco de não se ver um único raio de Sol. Toca não é a multidão de pés sujos ou o suor que escorre dos rostos cansados, não é o barulho de muitas pessoas caladas ou a indiferença fria dos olhares que não se cruzam.

Quem chega a essa cidade não vê nada além disso, passam-se muitos viajantes e nenhum chega realmente a conhecer Toca. Acredita-se que os lugares se resumem às suas plantas e mapas pendurados na parede, porém, poucos sabem que para se ver algum lugar é preciso se adentrar, se misturar aos corpos que vagueiam sem sentido até que o incompreensivo e estranho se transforme em normal. Mas poucos o fazem, quem arrisca pode se arrepender em um primeiro momento. Toca não parece bela, organizada ou nobre, ao contrário. Os caminhos se misturam em milhões de conexões e as vias se enxem de pessoas que vagueiam de um lado para o outro como que sem propósito. É difícil entender o funcionamento da cidade, é fácil se perder e se aborrecer com as pessoas lentas, quietas e desinteressadas. O barulho dos passos da multidão e os encontros ao acaso povoam a mente de todos, de modo que parecem se tornar surdos.

Porém, com o tempo, o barulho não se torna tão incômodo assim, o cheiro de suor e o calor das galerias parece mais ameno. Com o tempo você percebe que se prestar bastante atenção, em uma determinada hora do dia, consegue ouvir uma música suave ao longe, um canto puro e harmonioso. Se você seguir a multidão nesse momento, eles te levarão para a maior das galerias e ali, cada dia um grupo diferente de cidadões se apresentam aleatoriamente, sem que nada seja combinado ou ensaiado. Quem chega a Toca não a conhece ou entende em um primeiro momento, mas com o tempo é possível ver que existe uma harmonia no movimento dos trens e da multidão, é possível observar que as pessoas não se olham, porém tem algo entre elas que as une e a aparente indiferença não passa de um jeito de ser comum a todos. Não é por acaso que a cidade pareça um formigueiro, as formigas possuem uma sociedade complexa e organizada, difícil de ser entendida facilmente. As formigas não falam ou brigam entre si e assim o são os cidadões de Toca. o que pode parecer inumano para um estrangeiro, é na verdade marca de uma compreensão e harmonia completa. Os habitantes da cidade não andam sem sentido ou razão por entre os túneis, todos passam o dia indo em direção a maior das galerias para ouvir ou cantar a música que dá sentido às suas vidas.

sábado, 24 de setembro de 2011

As pessoas se preocupam de mais em tentar ajudar e de menos em ouvir



Eu preciso tanto falar... Só falar, sem choradeira, sem drama, sem palavras de compaixão, sem reação nenhuma. Só ser ouvida. Não quero ouvir nada, não quero ajuda, não quero conselhos, não quero nada. Só dizer que minha vida é uma merda, que eu não entendo nada, que eu não sei o que fazer, que eu tento ser racional mas isso de nada adianta, que as vezes eu tenho tanto medo, que eu falo que não preciso, mas preciso, que minha indiferença é sinal de fraqueza e fragilidade, que está tudo errado, que eu sinto falta de tudo, de mim mesma, de você, de carinho, de atenção que se recebida agora não faz mais sentido ou efeito. Que está tudo errado, tudo errado, que eu quero recomeçar mas não posso, que eu quero morrer mas não posso, que eu quero ser qualquer pessoa menos eu mas não posso, que eu quero tanta coisa impossível. Que de vez em quando aqui dentro dói tanto, que eu tento e tento e tento e nada adianta, que eu me sinto tão perdida. Que olhar para dentro de mim é quase suicídio, que tanta coisa foi arrancada de mim até que não se restasse quase nada.

As vezes eu quero dizer que não me encontro aqui e isso dói, que não vivo, que não existo. Estou cansada, quero que o mundo pare e me deixe aqui quieta, quero que ele me espere, estou cansada. Tudo vai tão bem e tão mau, aqui por fora eu consigo enganar todo mundo sempre que possível, mas aqui por dentro as coisas nunca estão certas. Sinto falta da infantilidade de poder chorar em qualquer lugar, a qualquer hora, por qualquer razão, de poder ser violenta sem me importar, de poder culpar todo mundo. Eu cresci tanto em tão pouco tempo. Adultos não choram, adultos são racional e razoáveis, adultos se controlam e sabem separar suas vidas pessoais das profissionais. Eu tento ser tudo isso e consigo. Mas chega uma hora que eu simplesmente não aguento, então eu me pego chorando em frente ao espelho, acreditando ser a pior pessoa da face da terra. O que há de errado comigo? Porque eu tenho que ser assim? Porque não posso só reclamar dos pequenos problemas, brigar por coisas idiotas e me animar com uma festa ou qualquer outra coisa? Todo mundo é assim, todo mundo parece viver tão facilmente, tão naturalmente.

Eu não... Dói tudo, está tudo errado, tudo uma bagunça. É impossível concertar tudo isso, e eu nem quero. Eu só preciso que alguém me escute uma vez na vida e me entenda, escute tudo, absolutamente tudo, quantas vezes eu tiver que dizer para isso se tornar banal, passado, indiferente, qualquer coisa. É só que as coisas ficam pesadas de mais e todo mundo está preocupado de mais em sentir pena e tentar ajudar para conseguir sentar e me ouvir.

domingo, 18 de setembro de 2011

Se acomodar e se acostumar


O ser humano tem uma habilidade grande de se acostumar com certas situações e aprender a conviver com elas. Alguns dizem que nós nos acomodamos. Não encaro como uma acomodação, encaro como uma estratégia para se sobreviver. Existe muitas coisas que não dependem só de nós, existem muitas coisas que não estão em nossas mãos ou são ruins de mais para serem seguradas. É por isso que quando algo ruim acontece e não temos controle sobre isso ou formas de nos defender, aprendemos a lidar com o acontecimento de um jeito ou de outro. Cada pessoa lida com a tragédia, por assim dizer, de uma forma única e pessoal.

As crianças costumam reprimir situações traumáticas, esquecer, entender aquilo como algo normal ou negar para si mesmas que algo esteja acontecendo. De um jeito ou de outro, essas defesas permitem que a criança sobreviva, não de forma inteiramente saudável ou normal, mas ao menos sobreviva. É como se existisse um armário dentro do seu cérebro que você pudesse por tudo o que você não conseguisse resolver ou entender, tudo o que fosse doloroso de mais para se encarar. Com o tempo esse armário vai ficando cada vez mais cheio, até que chega uma hora que não cabe mais nada ali e então a cada pequena coisa que você tentar jogar lá, há o perigo de tudo vim a tona e toda aquela sujeira se espalhar pelo seu cérebro.

Eu não encaro como algo ruim colocar algumas coisas no armário, não acho que eu conseguiria estar aqui hoje se quando menor não tivesse a possibilidade de esquecer ali tudo o que era doloroso de mais para se lembrar. Algumas pessoas dizem que isso é se acomodar, não encaro isso como se acomodar, encaro como a única alternativa para determinadas situações. Acho que se acomodar não é jogar as coisas no armário, mas se esquecer de limpá-lo as vezes. Se acomodar é deixar que as coisas continuem se amontoando e amontoando e tornando seu cérebro cada vez mais sujo. Se acomodar é se esquecer que o armário enche e que é preciso jogar algumas coisas fora de vez em quando. É uma tarefa difícil, extremamente complexa e dolorosa, mas necessária. Se acostumar com uma situação nem sempre significar se acomodar, se acostumar pode ser a única alternativa para lidar com aquela situação no momento, se acomodar é nunca mais se mexer porque um dia aquilo aconteceu. Entende a diferença?

Mudar.


As coisas são confusas de mais as vezes, como elas vão acontecendo e acontecendo e de repente você percebe que tudo está terrivelmente errado e sem controle. É assustador abrir os olhos em meio a um furacão, você não sabe ao certo por onde começar, como escapar ou resolver, como arrumar tudo de volta como deveria ser. As vezes você nem ao mesmo sabe como é esse "deveria ser" então tudo fica pior. Mas algo precisa ser feito, sentar e chorar há muito deixou de ser uma alternativa. Há muito você não é mais uma criança indefesa, há muito você tem força para arrumar pelo menos o que é possível na sua vida.

Mas há sempre o medo, as coisas vão deixar de ser? O novo é assustador, o futuro é horrivelmente incerto e distante. O furacão é incontrolável, mas é familiar. Como saber o que a vida te espera? Muitos pregam a idéia de que devemos arriscar, mas arriscar o que? Para onde? O que sabemos, por pior que seja, parece ser melhor do que o desconhecido. Isso para os pessimistas, claro. Essa vida aqui, como ela é, essa confusão, essa dor, é minha. E isso de certa forma é um consolo. Tenho medo de me mexer e acabar piorando tudo, tenho medo de perder o que para mim é certo, o pouco que para mim é certo.

Mas as vezes... As vezes mudar é vital. Você não percebe, mas é muito mais fácil o problema estar em si mesmo do que no outro, assim como é muito mais fácil todos enxergarem antes os problemas nos outros do que no próprio umbigo. As vezes você precisa abrir os olhos, no meio do furacão, não importa o quão assustador isso possa parecer. Nem sempre se mexer vai causar um dano pior ainda... Alias, o problema não é se mexer, mas como você se mexe. Há toda uma ciência por trás do jogo que é a vida. É verdade que normalmente as pessoas que mais reclamam são as que menos se mexem. Eu sou assim.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Estou cansada de ser vista como um problema



Me contaram que Lúcifer era o terceiro anjo mais importante do céu e por querer tomar o lugar de Jesus, o segundo, foi expulso do céu.

Inveja foi a acusação, ciúmes. E de terceiro Bom ele foi eleito o primeiro Mau. Estar livre do céu o tornou o oposto de deus, temido, respeitado, só que ao invés de amado, odiado. Ser visto como o rival do todo poderoso não me parece um castigo tão ruim assim. Quem ouviria falar de Lúcifer sem que ele tivesse desafiado a tal lei divina? Ninguém.

Ninguém quer admitir ou entender, mas as vezes ser mau e ser ouvido é a única saída para os invisíveis e incompreendidos. Ser alguém na escuridão é mais suportável do que ser ninguém na luz. Negue e eu te direi que você não sabe como é se sentir jogado, esquecido, diminuído, abusado, agredido, solitário e não levado a sério. Negue e eu te chamarei de ingênuo.

Mas cada um vê o mundo da sua forma. Eu entendo a maldade, a raiva, o ódio. Já conheci o mau na figura de muitos rostos, já o senti na pele e dentro de mim. No entanto, admito que não os odeio. Não, não... Meus carrascos são vítimas e seus carrascos também o são e assim por diante, em uma espiral sem fim. Eu os entendo.

Eu também seria capaz de fazer muitas coisas horríveis com qualquer pessoa, meu monstro aqui dentro permanece alerta e inquieto. Me resta a dúvida de porque eu sempre acabo canalizando o ódio, a raiva e a dor para mim mesma e não para os outros. Eu não entendo o que cala a minha boca, o que faz com que eu crave minhas unhas em mim mesma, o que grita em meu cérebro e abre cortes cada vez mais fundos em minha pele.

Talvez eu seja só medrosa de mais. Mas não consigo nem brilhar na escuridão nem ser vista na luz. A indiferença da minha existência, o fato de nunca ser ouvida e minha passividade é o que me mata. Quem me dera ser a pior pessoa do mundo. Quem me dera ter poder e controle sobre alguma coisa, qualquer coisa.

A pedrinha em seu bolso


Era uma vez uma pedra, vivia na rua, e por muitas vezes foi chutada por garotos irritados, adultos entediados e meninas impacientes. Ela era feia quando você a encontrou, toda rachada e marcada, mas algo de belo você viu ali, tão pequena e judiada, e você a colocou em seu bolso, levou para a casa e a poliu até ter um aspecto melhor, porém muitas marcas eram impossíveis de serem disfarçadas.

Era uma pedra relativamente leve e fácil de ser carregar por ai. As vezes você esquecia que ela existia, mas quando sua mão pousava em seu bolso você notava sua presença, primeiro simpática e frágil, mas com o tempo, pesada e incômoda. Você a colocava na palma da mão e analisava suas rachaduras. Talvez se eu polir e cuidar mais um pouquinho ela vai ficar mais bonita, você pensava. Mas não, se você olhar mais de perto vai ver que na verdade ela é tão feia e sem sentido que ninguém sabe porque ela existe, se não para ser chutada para lá e para cá.

O tempo foi passando e ter essa pedra em seu bolso passou a fazer parte de você, você se esqueceu que era só uma pedrinha qualquer e não a SUA pedrinha. Só sua. Ela incomoda agora e você não sabe o que fazer com ela, você pode simplesmente jogá-la fora, ela voltaria a ser uma pedra qualquer, mas você se acostumou com seu peso em seu bolso, você se acostumou a poli-la todo o dia, se acostumou com sua lealdade. É só uma pedra, o que tem de mais? As vezes irrita, as vezes você quer por outras coisas em seu bolso e ela está lá, ocupando espaço. Então você a atira longe, só para depois recuperá-la arrependida, você a chuta, você a esquece em lugares escuro, depois volta pedindo desculpa. A pedrinha não é tão pesada assim, mas com o tempo parece que foi ficando, uma pedra é sempre uma pedra, sempre pesa. Mas a importância que você deu a ela a tornou fácil de ter contigo e difícil de carregá-la.

É só uma pedra, você pode fazer o que quiser dela, pode torná-la útil se quiser, mas você simplesmente a deixa em seu bolso e a usa como desculpa para um problema. Você bate no peito e diz que foi você que a tirou da rua e a tornou importante, foi você que a poliu e cuidou... A pedrinha tem sorte de estar com você, certo? Mas é só uma pedrinha, quando você se irrita se acha no direito de fazer o que quiser, você não a enxerga como deveria ser, como todas as outras pedrinhas, não... É a sua pedrinha, você faz o que quiser dela e ela continua quieta e obediente, ela nunca faz nada. É verdade que as vezes ela força um pouco o peso, na esperança que você a pegue na mão e vendo suas marcas, a entenda não como um problema mas como simples pedra. Mas ela é só uma pedrinha, não tem muito que ela possa fazer, se não ser chutada para lá e para cá.

domingo, 11 de setembro de 2011

A necessidade de falar e a incompreensão


Eles dizem que precisamos falar sobre isso, eles, distantes, nos incentivam com suas vozes fracas a gritar para o mundo. Aqui, na vida real, ninguém quer falar sobre isso, ninguém quer ouvir, ninguém quer ver ou admitir que coisas ruins acontecem com pessoas muito mais próximas do que você poderia imaginar. Eles perguntam porque você não faz nada, porque você não conta para essa ou aquela pessoa, mas quando você precisa falar sobre isso com eles, eles fazem caretas, ficam nervosos, choram, não conseguem olhar em seus olhos, não conseguem ouvir.

Você se sente culpado, tem vontade de pedir desculpas por ter tocado no assunto, como se aquilo tivesse acontecido com eles e não com você. Você abaixa a cabeça e promete para si mesmo que nunca mais vai falar sobre aquilo, você entende cada vez mais que aquilo é horrível o suficiente para não ser dito em voz alta, você se envergonha, se esconde, pensa que querer falar sobre isso é egoísmo seu, porque agride o ouvido e o coração das outras pessoas. No fundo eles estão muito mais preocupadas com seus próprios narizes, por isso são incapazes de te olharem nos olhos e ouvirem tudo o que você tem a dizer.

Você se cala e força um sorriso. No final quem acaba sendo consolado é quem ouviu suas meias palavras e não você. No final parece que você é culpado por tudo. Como pode ser tão egoísta para dizer isso em voz alta?? Como pode deixar os outros preocupados assim? Ora que monstro... Você se arrepende profundamente de ter tentado falar, de ter essa necessidade doentia de colocar para fora o que devora sua alma. A reação das pessoas é tão horrível que parece que você as está destruindo... Quando a única coisa que você queria era alguém que permanecesse em silêncio ao seu lado, entendendo e ouvindo o que você precisa dizer... Dizer simplesmente por dizer, para tirar isso aqui de dentro... Mas ninguém entende isso ou quer fazer isso, você diz com dificuldade duas palavras e eles já estão tentando resolver, já estão inquietos e perturbados, esperando que você os console. A única coisa que você queria era alguém capaz de te ouvir, só isso, você não queria conselhos, xingamentos, formas de resolver, pena ou lágrimas... Não, você não queria nada disso.

E eles ainda se perguntam porque você não fala.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Inquietação e o que falta

Ando meio sem sentido, meio perdida, meio impaciente. A vida me irrita. As pessoas me irritam. Tudo. Tem algo de errado para variar. Quero chorar e não consigo, quero rir e não consigo, só fico parada, como um pedaço de carne morta, não quero falar, não quero ser legal com as pessoas, não quero ser educada, não quero me controlar, não quero ser responsável, não quero ouvir, não quero me importar, não quero me mexer. Eu não quero, mas continuo fazendo tudo isso, ou algo em mim continua, não sei, não sei quem estou sendo ou quem eu sou, a linha que delimitava meu monstro e eu mesma se partiu, agora tudo está misturado, não sei quem existe, quem fala o que, não sei nada. Não sei se isso é bom ou ruim. Eu gostava de conseguir me reconhecer, eu gostava de manter meu monstro separado do que eu sou. E viver duas vidas, separar as duas vidas, minha doença uma coisa e eu outra coisa. Agora não estou mais conseguindo fazer isso...

Tem sempre algo errado, sempre. Estou tão cansada, tão cansada... As vezes sonho que posso deitar em uma cama e nunca mais levantar, fechar os olhos para sempre, porque o pior pesadelo acontece quando estamos acordados. Estou tão triste, tão triste... Todos os dias eu tento limpar minhas feridas, todos os dias eu espero pacientemente que elas fechem... Oh, pelo amor de deus, quanto tempo mais isso vai durar? Quando eu vou poder sorrir sem esse peso nas minhas costas? Quando vou poder viver minha vida? É tão difícil manter tudo sob controle. O tempo escorrega pelos meus braços e eu ainda não estou bem, amigos vem e vão, problemas vem e voltam, cortes se cicatrizam, alucinações aparecem e desaparecem e eu ainda não estou bem. Não estou nada bem.

O que eu tenho que fazer? O que eu tenho que fazer? Não está vendo que algo vive brincando de me empurrar para o fundo do poço de novo e de novo? De repente, fica difícil falar, fica difícil se mexer, ou o que quer que seja, e eu não sinto mais vontade de estudar, de ir para a faculdade, de conversar, de pintar, de ler, de ter amigos, de viver. Minha psicóloga tenta e tenta fazer com que eu avance à passos de tartaruga, e eu regrido e avanço ao sabor das ondas, sem aviso, sem sentido. Porque eu estou aqui mesmo? Doutora, doutora, não estou bem, por favor me ajude, me diga o que fazer, por favor, me de um pouco de razão, me mostre o caminho, pegue minha mão e me puxe para cima, está tudo tão difícil de repente.

De que adianta todos esse elogios ingênuos e inúteis... Se eu não consigo fazer coisas tão básicas, se eu tenho dificuldade com tantas coisas que são naturais para todo o resto do mundo. Não estou bem... É tão difícil estar viva. Sempre me pergunto como as pessoas simplesmente existem e vão vivendo... Como se fosse tudo tão fácil e simples. É tudo tão... pesado, complicado e doloroso, qualquer movimento, qualquer palavra, tudo. Estou cansada... Quero a leveza do mundo para mim, mas sinto como se pesasse toneladas. Não sei para que serve a vida.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

A maldade - Da onde vem, para onde vai, para quem vai


Era uma vez uma criança muito má. Não importa qual era seu nome, era só mais uma garota ruim. Muito sorridente, muito agitada, muito chorona, muito quieta, muito irritada, muito brava, muito nervosa, muito perfeccionista. Insuportável. Não se dava bem com os colegas, brigava com todos, exigia de mais de todos. Se você olhasse de longe ela parecia mimada, parecia achar que ninguém era bom o bastante para estar perto dela. Se você olhasse de perto iria perceber que o maior problema que ela tinha era com ela mesma, o maior incomodo, inquietação e dor, vinham de dentro. Mas ninguém a olhava de perto, ninguém presta muita atenção nas crianças para falar a verdade, ela só levava broncas e era ensinada do quão ruim ela era. A garota má olhava para os adultos sem entendê-los, não importa o que ela fizesse ela era castigada, e quando não a castigavam, ela mesma o fazia.

"Quero ser uma garota boazinha!" Ela pensava consigo mesma. E aceitava tudo o que lhe era infligido ansiosa para conseguir ser perfeita. "Quero que as pessoas gostem de mim!" Ela pensava sorrindo para os piores adultos na esperança que eles a amassem. E assim a garota má foi vivendo.

A verdade era que quase ninguém parecia saber que ela existia. Era só uma garotinha inconveniente. Continue quietinha assim meu anjo, isso. Boa garota. Ela sorri, ela gosta de ser quietinha e obediente, assim ela recebe elogios e as pessoas parecem gostar mais dela. A garota má faz tudo o que os adultos querem. Ela é má com outras crianças, mas é muito obediente com os adultos. Com o tempo a garota má não consegue mais ser má com as outras crianças, com o tempo ela se torna cada vez mais fraca e pequena, as outras crianças parecem maior que ela e é a vez deles de serem maus com ela. Mas ninguém percebe que eles estão sendo maus com ela, ninguém faz nada, eles se tornam cada vez piores. Porque ninguém vê?

Lentamente a garota má vai tomando conhecimento de tudo o que havia de errado em sua vida, devagar, bem devagar... É quase irreal. Ela não confiava mais em ninguém, ela continuava má, ela desenhava cortes em seu corpo friamente, desejando ser forte o bastante para fazer isso nas outras pessoas e não nela. A garota se mata em uma noite quente, atirando-se pela janela do décimo quinto andar do apartamento que morava com seus pais nojentos. Nas mãos de seu pai estava o cheiro de sexo e medo que ela exalava quando ele a tocava, foi a única coisa dela que ficou com ele. Foi embora finalmente, feliz. A garota má.

O que eu acho (Você me conhece?)


Ah... As lágrimas são incontroláveis, certo? São... São sim. Você recebe algumas bofetadas no rosto e não sente absolutamente nada, como se fosse um monstro, você não sente, permanece olhando o nada com uma indiferença assustadora. Mas de repente... De repente, um tom de voz, uma meia palavra, uma frase simples e impensada, tudo desaba. Você sente tudo, tudo. Ah... Eu gostaria de conseguir falar, gostaria de fazer com que você me entendesse, gostaria que minhas lágrimas e minhas cicatrizes se transformassem em palavras para que eu as pudesse ditar para você. Ah, como eu queria abrir meu peito, cirurgicamente, e te mostrar tudo aqui dentro, como eu gostaria... Mas eu simplesmente me engasgo e tropeço e no fim não digo nada.

O péssimo das pessoas que falam pouco é que as outras completam suas frases cedo de mais, as interpretam cedo de mais. Ninguém tem paciência para fazer com que alguém fale, alguém que tem dificuldade para dizer, não, eles não esperam, ele vão falando e falando e se esquecem que quem deveria estar falando é a outra pessoa e não eles. As pessoas são sempre vaidosas de mais, sempre acham que o que elas tem a dizer é o mais importante e digno, o mais certo. As pessoas são injustas também, elas ignoram seus erros e apontam os dos outros sem problema nenhum, as vezes por vaidade também aceitam que erraram, por pura vaidade. "Olhe como eu sou nobre! Eu reconheço meu erro!".

As pessoas sempre se acham muito especiais, muito importantes, muito inteligentes, muito únicas. Acho isso deplorável. Sempre pensam nelas mesmas, sempre a colocam em um patamar, sempre acreditam que tudo vai dar certo, sempre possuem os maiores sonhos, e etc, etc e etc. E eu só me ferro. Eu me acho uma bosta, uma merdinha qualquer, alguém que deveria morrer. Eu, insegura, desdobro meu universo inteiro para que ele se encaixe na vida dos outros, eu faço de tudo, eu me esqueço, me coloco cada vez mais para baixo e sou puxada de um lado para o outro como uma cachorrinha, as pessoas me usam, se aproveitam e depois me descartam. Sempre foi assim. E eu faço de tudo para ser amada, tudo o que eu posso (quando estou sob controle), tudo, eu me esforço sempre o máximo que eu posso, eu sempre estou fazendo de tudo, o tempo todo, da melhor forma possível. Mas ninguém faz isso por mim, óbvio que não. Então resta eu sozinha no final, uma pilha de nervos, obsessiva e psicótica e nada está perfeito.

Isso tudo é frustante de mais. E o pior é que apesar de tudo, eu é que estou errada, eu é que faço isso comigo mesma, eu é que me fodo sozinha. A culpa sempre é minha, não adianta falar que não é, um simples descuido seu ou de qualquer pessoa e mais uma pedra de culpa é atirada na minha direção, é incrível. Não adianta ter pena quando eu estou fodida, no fundo do poço, totalmente em pedaços, não adianta passar a mão na minha cabeça e se fazer de boazinha. "Olhe como eu estou ajudando essa pobre coitada! O que seria dela sem mim?". Vocês estão ajudando a si mesmos e seus egos, não a mim. Eu agradeço e abaixo a cabeça, porque afinal é esse o meu papel, me resignar e agradecer a deus por alguém ainda querer ficar do meu lado. Mas as vezes eu tenho vontade de mandar o mundo inteiro se explodir. A quem vocês estão tentando enganar?

Quando vocês realmente me escutam? Nunca? Uma vez na vida talvez? No fim sempre que eu tento falar qualquer coisa, vocês todos acabam falando de vocês mesmos. Sinceramente, estou pouco me fudendo se sua vida é uma merda tão grande quanto a minha ou não. Sinceramente, tentar se comunicar com o mundo é uma coisa extremamente inútil. Aqui, só aqui, na porcaria desse blog que eu consigo falar alguma coisa.

Vocês pedem tanta coisa para mim, você esperam tanta coisa, sonham tanto para mim, vocês exigem tanto... Enquanto você pede para eu ser outra pessoa, a única coisa que eu te peço é para que me ame do jeito que eu sou.

Não deveria ser tão difícil. É engraçado como meu "Eu te amo" parece que não significa nada as vezes... Para mim significa tudo, mas para os outros não. Eles querem que eu seja assim e assado, mude isso e aquilo, porque eu sendo como eu sou eles não acreditam no que eu digo, é estranho. É muito esquisito. As vezes me pergunto se as pessoas gostam de mim como eu sou ou se gostam da pessoa que eles pensam que eu sou.